Sobre Nossos Pais

Você é uma expressão do universo.
Você vêm tomando forma desde o big-bang.
Você é composto de partículas de estrelas que explodiram
há bilhões de anos, e da luz do sol de hoje e de amanhã,
assim como da água da chuva que impulsiona
a semente que hidrata seu coração.
Seus ancestrais são desconhecidos, mas e daí?
Impossível é negar a sua ancestralidade.
Ela existe por si só e por todos nós.
Afinal de contas, estamos aqui.
Como negar seu tataravô?
Negar sua ancestralidade é negar a si mesmo, agora!
É por isso que honrar nossos antepassados
é uma questão de vida, de agradecimento por esta vida.
Mesmo que nunca os tenhamos visto
em carne/osso ou mesmo em forma de poeira cósmica.
É agradecer também por todos aqueles que virão.
Olhar para nossas ancestrais é visualizar uma árvore infinita de ramos
em projeção geométrica que vai além da nossa compreensão.
Nesta árvore eu te encontrei, se você não sabe.
Pois fique sabendo que um dia nos abraçamos
em algum lugar neste universo.
E é sempre bom lembrar: as partículas
da primeira explosão ainda estão por aqui,
nessa tela e dentro, além dos seus olhos.
Não tente procurar.
Apenas se lembre.
De você.

_____________

Texto inspirado na aula 7 de “O Valor dos Valores”, onde a professora de yoga e vedānta, Glória Arieira, menciona as ‘expressões deste universo’ e por Swami Dayānanda, em seu maravilhoso livro “Īśvara em Sua Vida”, quando ele escreve sobre ser impossível negar seu tataravô. Também inspirado pelo prof. Patrick van Lammeren, que na última aula de Simbolismo Védico me ensinou a olhar para a imensidão de nossos antepassados. OM!

***

“Eu saúdo a linhagem de mestres que começa com Śiva, tem Śaṅkara no meio
e vai até meu mestre.”

IV – SUA ESTABILIDADE, PACIÊNCIA E INCLUSÃO

Carta IV – SUA ESTABILIDADE, PACIÊNCIA E INCLUSÃO (Thich Nhat Hanh – do livro “Love Letter to the Earth”)

“Querida Mãe Terra,
Você é este planeta azul infinitamente belo, perfumado, fresco e gentil. Sua paciência e resistência incomensuráveis fazem de você um grande bodhisattva. Mesmo que tenhamos cometido muitos erros, você sempre nos perdoa. Cada vez que voltamos para você, você está pronta para abrir os braços e nos abraçar.

Sempre que estou instável, sempre que perco o contato comigo mesmo ou me perco no esquecimento, na tristeza, no ódio ou no desespero, sei que posso voltar para você. Tocando em você, posso encontrar um refúgio; Posso restabelecer minha paz e recuperar minha alegria e autoconfiança. Você ama, protege e cuida de todos nós sem discriminação.

Você tem uma imensa capacidade de abraçar, manipular e transformar tudo o que é lançado em você, sejam grandes asteróides, lixo e sujeira, fumaça venenosa ou lixo radioativo. O tempo ajuda você a fazer isso, e sua história mostra que você sempre consegue, mesmo que demore milhões de anos. Você foi capaz de restabelecer o equilíbrio após a colisão devastadora que criou a lua e suportou pelo menos cinco extinções em massa, restaurando-se todas as vezes.Você tem uma capacidade extraordinária de renovar, transformar e curar a si mesma – e também a nós, seus filhos.

Tenho fé em seu grande poder de cura. Minha fé vem de minha própria observação e experiência, não de algo que outros me disseram para acreditar. É por isso que sei que posso me refugiar em você. Enquanto ando, sento e respiro, posso me entregar a você, confiar totalmente em você e permitir que você me cure. Eu percebo que não preciso realmente fazer nada. Posso simplesmente relaxar, liberar toda a tensão do meu corpo e todos os medos e preocupações da minha mente. Quer esteja sentado ou andando, deitado ou em pé, permito-me refugiar-me em ti, e permito-me ser abraçado e curado por ti. Eu me confio a você, Mãe Terra. Cada um de nós precisa de um lugar de refúgio, mas podemos não saber como encontrá-lo ou como chegar lá. Olhando profundamente hoje, posso ver que meu verdadeiro lar, meu verdadeiro lugar de refúgio é você, meu amado planeta. Eu me refugio em você, Mãe Terra. Não preciso ir a lugar nenhum para encontrá-la; você já está em mim e eu já estou em você.

Querida Mãe, cada vez que me sentar em silêncio em sua Terra, estarei ciente de que, porque você está em mim, posso incorporar suas qualidades maravilhosas: de solidez, perseverança, paciência e tolerância; de profundidade, resistência e estabilidade; de grande coragem, destemor e criatividade inesgotável. Prometo praticar de todo o coração para realizar essas qualidades, sabendo que você já plantou esses potenciais como sementes no solo do meu coração e mente.”



YOUR STABILITY, PATIENCE, AND INCLUSIVENESS

Dear Mother Earth,
You are this infinitely beautiful blue planet, fragrant, cool, and kind. Your immeasurable patience and endurance makes you a great bodhisattva. Even though we’ve made many mistakes, you always forgive us. Every time we return to you, you are ready to open your arms and embrace us.

Whenever I am unstable, every time I lose touch with myself, or am lost in forgetfulness, sadness, hatred, or despair, I know I can come back to you. Touching you, I can find a refuge; I can reestablish my peace and regain my joy and self-confidence. You love, protect, and nurture all of us without discrimination.

You have an immense capacity to embrace, handle, and transform everything that is cast at you, whether it be great asteroids, refuse and filth, poisonous fumes, or radioactive waste. Time helps you to do this, and your history has shown that you always succeed, even if it takes millions of years. You were able to reestablish equilibrium after the devastating collision that created the moon and have endured at least five mass extinctions, reviving yourself every time. You have an extraordinary capacity to renew, transform, and heal yourself—and also us, your children.

I have faith in your great power of healing. My faith comes from my own observation and experience, not from something others have told me to believe. That’s why I know I can take refuge in you. As I walk, sit, and breathe, I can surrender myself to you, trust wholly in you, and allow you to heal me. I know I don’t have to do anything at all. I can simply relax, release all the tension in my body, and all the fears and worries in my mind. Whether I’m sitting or walking, lying down or standing, I allow myself to take refuge in you, and allow myself to be held and healed by you. I entrust myself to you, Mother Earth. Each one of us needs a place of refuge, but we may not know how to find it or how to get there. Looking deeply today, I can see that my true home, my true place of refuge is you, my beloved planet. I take refuge in you, Mother Earth. I do not have to go anywhere to find you; you are already in me and I am already in you.

Dear Mother, each time I sit in stillness on your Earth, I will be aware that because you are in me, I can embody your wonderful qualities: of solidity, perseverance, patience, and forbearance; of depth, endurance, and stability; of great courage, non-fear, and inexhaustible creativity. I vow to practice wholeheartedly to realize these qualities, knowing that you have already sown these potentials as seeds in the soil of my heart and mind.

III – CAMINHANDO COM CARINHO SOBRE A MÃE TERRA

Carta III – CAMINHANDO COM CARINHO SOBRE A MÃE TERRA (Thich Nhat Hanh, do livro “Love Letter to the Earth”)

“Querida Mãe Terra,
Cada vez que eu pisar na Terra, vou me treinar para ver que estou caminhando sobre você, minha Mãe. Cada vez que coloco meus pés na Terra tenho a chance de estar em contato com você e com todas as suas maravilhas. A cada passo, posso tocar o fato de que você não está apenas abaixo de mim, querida mãe, mas também dentro de mim. Cada passo atento e gentil pode me nutrir, me curar e me colocar em contato comigo mesmo e com você no momento presente.

Caminhando com atenção plena, posso expressar meu amor, respeito e cuidado por você, nossa preciosa Terra. Tocarei na verdade de que mente e corpo não são duas entidades separadas. Vou me treinar para olhar profundamente para ver sua verdadeira natureza: você é minha mãe amorosa, um ser vivo, um grande ser – uma imensa, bela e preciosa maravilha. Você não é apenas matéria, você também é mente, você também é consciência. Assim como o belo pinheiro ou o tenro grão de milho possuem um senso inato de conhecimento, você também possui. Dentro de você, querida Mãe Terra, existem os elementos terra, água, ar e fogo; e também há tempo, espaço e consciência. Nossa natureza é a sua natureza, que também é a natureza do cosmos.

Quero caminhar com delicadeza, com passos de amor e com muito respeito. Caminharei com meu próprio corpo e mente unidos em unidade. Sei que posso andar de tal forma que cada passo seja um prazer, cada passo seja nutritivo e cada passo seja curador – não apenas para meu corpo e mente, mas também para você, querida Mãe Terra. Você é o planeta mais bonito de todo o nosso sistema solar. Não quero fugir de ti, querida mãe, nem me apressar. Eu sei que posso encontrar a felicidade aqui com você. Não preciso me apressar para encontrar mais condições de felicidade no futuro. A cada passo posso me refugiar em ti. A cada passo posso desfrutar de suas belezas, seu delicado véu de atmosfera e o milagre da gravidade. Eu posso parar meu pensamento. Eu posso andar relaxado e sem esforço. Caminhando com esse espírito, posso experimentar o despertar. Posso despertar para o fato de que estou vivo e que a vida é um precioso milagre. Posso despertar para o fato de que nunca estou sozinho e nunca posso morrer. Você está sempre dentro de mim e ao meu redor a cada passo, alimentando-me, abraçando-me e levando-me para o futuro.

Querida Mãe, você deseja que vivamos com mais consciência e gratidão, e podemos fazer isso gerando energias de atenção plena, paz, estabilidade e compaixão em nossas vidas diárias. Por isso, hoje faço a promessa de retribuir seu amor e realizar esse desejo investindo cada passo que dou sobre você com amor e ternura. Estou caminhando não apenas em matéria, mas em espírito.”



III WALKING TENDERLY ON MOTHER EARTH

Dear Mother Earth,

Every time I step upon the Earth, I will train myself to see that I am walking on you, my Mother. Every time I place my feet on the Earth I have a chance to be in touch with you and with all your wonders. With every step I can touch the fact that you aren’t just beneath me, dear Mother, but you are also within me. Each mindful and gentle step can nourish me, heal me, and bring me into contact with myself and with you in the present moment.

Walking in mindfulness I can express my love, respect, and care for you, our precious Earth. I will touch the truth that mind and body are not two separate entities. I will train myself to look deeply to see your true nature: you are my loving mother, a living being, a great being—an immense, beautiful, and precious wonder. You are not only matter, you are also mind, you are also consciousness. Just as the beautiful pine or tender grain of corn possess an innate sense of knowing, so, too, do you. Within you, dear Mother Earth, there are the elements of Earth, water, air and fire; and there is also time, space, and consciousness. Our nature is your nature, which is also the nature of the cosmos.

I want to walk gently, with steps of love and with great respect. I shall walk with my own body and mind united in oneness. I know I can walk in such a way that every step is a pleasure, every step is nourishing, and every step is healing—not only for my body and mind, but also for you, dear Mother Earth. You are the most beautiful planet in our entire solar system. I do not want to run away from you, dear Mother, nor to hurry. I know I can find happiness right here with you. I do not need to rush to find more conditions for happiness in the future. At every step I can take refuge in you. At every step I can enjoy your beauties, your delicate veil of atmosphere and the miracle of gravity. I can stop my thinking. I can walk relaxingly and effortlessly. Walking in this spirit I can experience awakening. I can awaken to the fact that I am alive, and that life is a precious miracle. I can awaken to the fact that I am never alone and can never die. You are always there within me and around me at every step, nourishing me, embracing me, and carrying me far into the future.

Dear Mother, you wish that we live with more awareness and gratitude, and we can do this by generating the energies of mindfulness, peace, stability, and compassion in our daily lives. Therefore I make the promise today to return your love and fulfill this wish by investing every step I take on you with love and tenderness. I am walking not merely on matter, but on spirit.

VII – SUA REALIDADE ÚLTIMA: SEM MORTE, SEM MEDO

Carta VII – SUA REALIDADE ÚLTIMA: SEM MORTE, SEM MEDO (Thich Nhat Hanh, do livro “Love Letter to the Earth”)

“Querida Mãe Terra,

Você nasceu da poeira de supernovas distantes e estrelas antigas. Sua manifestação é apenas uma continuação e quando você deixar de existir nesta forma atual, você também continuará em outra. Sua verdadeira natureza é a dimensão última da realidade – a natureza de não-vir e não-ir, não-nascimento e não-morte. Esta também é nossa verdadeira natureza. Se formos capazes de toca-lá, podemos experimentar a paz e a liberdade do não-medo.

E ainda, por causa de nossa visão limitada, ainda nos perguntamos o que acontecerá conosco quando nossa forma física se desintegrar. Quando morremos, simplesmente voltamos para você. Você nos deu à luz no passado e sabemos que continuará a nos dar à luz de tempos em tempos no futuro. Sabemos que nunca podemos morrer. Cada vez que nos manifestamos, estamos renovados e novos; cada vez que voltamos para a Terra, você nos recebe e nos abraça com grande compaixão. Prometemos nos treinar para olhar profundamente, ver e tocar essa verdade – que nossa expectativa de vida é a sua, e sua expectativa de vida é ilimitada. Sabemos que a dimensão última e a histórica – a numenal e a fenomenal são duas dimensões da mesma realidade. Tocando a dimensão histórica – uma folha, uma flor, um seixo, um raio de luz, uma montanha, um rio, um pássaro ou nosso próprio corpo – podemos tocar o máximo. Quando tocamos profundamente em um, tocamos em tudo. Isso é interser.

Querida Mãe, juramos vê-la como nosso corpo e ver o sol como nosso coração. Vamos nos treinar para reconhecer você e o sol em cada célula do nosso corpo. Encontraremos vocês dois, Mãe Terra e Pai Sol, em cada folha tenra, em cada clarão de relâmpago, em cada gota d’água. Diligentemente, praticaremos para ver o que há de melhor e perceber nossa verdadeira natureza. Vamos praticar para ver que nunca nascemos e nunca morreremos.

Sabemos que na dimensão última não há nascimento nem morte, nem ser nem interser, nem sofrimento nem felicidade, nem bem nem mal. Vamos nos treinar para olhar profundamente no mundo dos sinais e aparências com o insight da interser, a fim de ver que se não houvesse morte, não poderia haver nascimento; sem sofrimento, não haveria felicidade; sem a lama, o lótus não pode crescer. Sabemos que felicidade e sofrimento, nascimento e morte dependem um do outro. Esses pares de opostos são apenas conceitos. Quando transcendemos essas visões dualistas da realidade, ficamos livres de toda ansiedade e medo.

Tocando a última, ficamos felizes e à vontade – estamos em nosso elemento, livres de todas as noções e conceitos. Somos tão livres quanto um pássaro voando no céu, tão livres quanto um cervo saltando pela floresta. Vivendo profundamente em atenção plena (mindfulness), tocamos nossa verdadeira natureza de interdependência e interexistência. Sabemos que somos um com você e com todo o cosmos. A realidade última transcende todas as noções e conceitos. Não pode ser descrito como pessoal ou impessoal, material ou espiritual, nem como objeto ou sujeito da mente. A realidade última está sempre brilhando e brilhando sobre si mesma. Não precisamos buscar o que há de melhor fora de nós mesmos. Nós tocamos o máximo no aqui e agora.”

VII – YOUR ULTIMATE REALITY: NO DEATH, NO FEAR

“Dear Mother Earth,

You were born from the dust of distant supernovas and ancient stars. Your manifestation is but a continuation and when you cease to exist in this current form you too will continue in another. Your true nature is the ultimate dimension of reality the nature of no-coming and no-going, no birth and no-death. This is also our true nature. If we’re able to touch this we can experience the peace and freedom of non fear.

And yet, because of our limited view, we still wonder what will happen to us when our physical form disintegrates. When we die, we merely return to you. You have given birth to us in the past, and we know that you will continue to give birth to us time and time again in the future. We know we can never die. Each time we manifest, we’re fresh and new; each time we re turn to the Earth, you receive and embrace us with great compassion. We promise to train ourselves to look deeply, to see and touch this truth-that our lifespan is your lifespan, and your lifespan is limitless. We know that the ultimate and the historical—the noumenal and the phenomenal are two dimensions of the same realitty. Touching the historical dimension—a leaf, a flower, a pebble, a beam of light, a mountain, a river, a bird, or our own body -we can touch the ultimate. When we deeply touch the one, we touch the all. This is interbeing.

Dear Mother, we vow to see you as our body, and to see the sun as our heart. We will train ourselves to recognize you and the sun in every cell of our body. We will find you both, Mother Earth and Father Sun, in each tender leaf, in each flash of lightning, in each drop of water. Diligently, we will practice to see the ultimate and re alize our own true nature. We will practice to see that we have never been born and we will never die.

We know that in the ultimate dimension there is no birth and no death, no being and no nonbeing, no suffering and no happiness, and no good and no evil. We will train ourselves to look deeply into the world of signs and appearances with the insight of interbeing, in order to see that if there were no death, there could be no birth; without suffering, there would be no happiness; without the mud, the lotus can’t grow. We know that happiness and suffering, birth and death, lean on each other. These pairs of opposites are only concepts. When we transcend these dualistic views of reality, were freed from all anxiety and fear.

Touching the ultimate we’re happy and at ease – we’re in our element, free from all notions and concepts. We’re as free as a bird soaring in the sky, as free as a deer leaping through the woods. Living deeply in mindfulness, we touch our true nature of interdependence and interbeing. We know we are one with you and with the whole cosmos. The ultimate reality tran scends all notions and concepts. It can’t be described as personal or impersonal, mate rial or spiritual, nor as the object or subject of mind. Ultimate reality is always shin ing and shining on itself. We don’t need to look for the ultimate outside of ourselves. We touch the ultimate in the very here and now.”

I – AMADA MÃE DE TODOS OS SERES

Carta I – AMADA MÃE DE TODOS OS SERES (Thich Nhat Hanh, do livro “Love Letter to the Earth”)

“Querida Mãe Terra, me inclino diante de você enquanto olho profundamente e reconheço que você está presente em mim e que sou uma parte de você. Nasci de você e você está sempre presente, me oferecendo tudo o que preciso para me nutrir e crescer. Minha mãe, meu pai e todos os meus ancestrais também são seus filhos. Respiramos seu ar fresco. Bebemos sua água limpa. Comemos sua comida nutritiva. Suas ervas nos curam quando estamos doentes.

Você é a mãe de todos os seres. Eu a chamo pelo nome humano de Mãe, mas sei que sua natureza maternal é mais vasta e antiga do que a humanidade. Somos apenas uma espécie jovem de seus muitos filhos. Todos os milhões de outras espécies que vivem – ou viveram – na Terra também são seus filhos. Você não é uma pessoa, mas eu sei que você também não é menos que uma pessoa. Você é um ser vivo que respira na forma de um planeta.

Cada espécie tem sua própria linguagem, mas como nossa Mãe você pode nos entender a todos. É por isso que você pode me ouvir hoje enquanto abro meu coração para você e lhe ofereço minha oração.

Querida Mãe, onde quer que haja solo, água, rocha ou ar, você está aí, me alimentando e me dando vida. Você está presente em cada célula do meu corpo. Meu corpo físico é o seu corpo físico, e assim como o sol e as estrelas estão presentes em você, eles também estão presentes em mim. Você não está fora de mim e eu não estou fora de você. Você é mais do que apenas meu ambiente. Você não é nada menos do que eu mesmo.

Prometo manter viva a consciência de que você está sempre em mim e eu sempre estou em você. Prometo estar ciente de que sua saúde e bem-estar é minha própria saúde e bem-estar. Sei que preciso manter essa consciência viva em mim para que ambos possamos estar em paz, felizes, saudáveis ​​e fortes.

Às vezes esqueço. Perdido nas confusões e preocupações do dia a dia, esqueço que meu corpo é o seu corpo, e às vezes até esqueço que, afinal, tenho um corpo. Sem saber da presença do meu corpo e do lindo planeta ao meu redor e dentro de mim, sou incapaz de valorizar e celebrar o precioso presente da vida que você me deu. Querida Mãe, meu desejo profundo é despertar para o milagre da vida. Prometo me treinar para estar presente para mim, minha vida e para você a cada momento. Sei que minha verdadeira presença é o melhor presente que posso oferecer a você, aquela que amo.”

#thichnhathanh

BELOVED MOTHER OF ALL THINGS

“Dear Mother Earth, I bow my head before you as I look deeply and recognize that you are present in me and that I’m a part of you. I was born from you and you are always present, offering me everything I need for my nourishment and growth. My mother, my father, and all my ancestors are also your children. We breathe your fresh air. We drink your clear water. We eat your nourishing food. Your herbs heal us when we’re sick.

You are the mother of all beings. I call you by the human name Mother and yet I know your mothering nature is more vast and ancient than humankind. We are just one young species of your many children. All the millions of other species who live—or have lived—on Earth are also your children. You aren’t a person, but I know you are not less than a person either. You are a living breathing being in the form of a planet.

Each species has its own language, yet as our Mother you can understand us all. That is why you can hear me today as I open my heart to you and offer you my prayer.

Dear Mother, wherever there is soil, water, rock or air, you are there, nourishing me and giving me life. You are present in every cell of my body. My physical body is your physical body, and just as the sun and stars are present in you, they are also present in me. You are not outside of me and I am not outside of you. You are more than just my environment. You are nothing less than myself.

I promise to keep the awareness alive that you are always in me, and I am always in you. I promise to be aware that your health and well-being is my own health and well-being. I know I need to keep this awareness alive in me for us both to be peaceful, happy, healthy, and strong.

Sometimes I forget. Lost in the confusions and worries of daily life, I forget that my body is your body, and sometimes even forget that I have a body at all. Unaware of the presence of my body and the beautiful planet around me and within me, I’m unable to cherish and celebrate the precious gift of life you have given me. Dear Mother, my deep wish is to wake up to the miracle of life. I promise to train myself to be present for myself, my life, and for you in every moment. I know that my true presence is the best gift I can offer to you, the one I love.”

#thichnhathanh

Das Coisas da Vida

As coisas são como elas não são.
No mundo das aparências.
O corpo manifesto na imensidão
A palavra citada é imperfeita.

Na alma do amor há sementes.
No absoluto, dissolvendo o argumento.
Como o vento manifesto na escuridão.
No silêncio da luz no infinito.

As coisas são como elas não são.
E o reflexo é a face da vida em mim.
E a vida em mim se manifesta.
Por todos os cantos do universo.

A chance

Não merecemos a chance.
Não fizemos por onde.
Desdenhamos.
E esquecemos do óbvio.
Não cuidamos.
Apontamos erros.
E os espelhos curvos mostravam.
O inverso daquilo que apontava.
E falhamos desapontados.
Amostra e isolados ficamos.
Mal avaliamos o que éramos.
E nos deixamos à deriva.
Presos ao que nos restava:
Um pouco de raiva.
Misturada ao medo.
Medo de estar errado.
Mas sem amor o que adianta?
Pois não se te coisa alguma.
Nem perdão de alma.
Nem palavra de nada.

A fuga

Seria a atmosfera,
Uma paixão fulminante,
Um susto repentindo.
Ou apenas os dias normais.O que te prende a esse mundo?

Seria a busca do conhecimento.
Pra banir essa ignorância que acorrenta?
Descalço, amordaçado sob o céu,
Com os pés plantados, ereto ao plano do olhar.
Penso que correr é a escapatoria natural.
Basta saber de quem.

Mauricio Bahia

Atemporal

Veja bem:

A vida não está no tempo.
Mas nas coisas da vida.
E quando você as olha de perto.
Percebe o que não era vazio.

Mais perto:

Tudo que era pedra, parece poesia
Aquele amor inteiro, era fragmento.
Prefiro então não te ver pelo nome.
Nem te carregar como o peso numa tristeza.
Ou flutuar na incrível leveza daquela felicidade.
Seria insano de minha parte.

Mais perto:

Pois em mim existe um mar.
E se te julgasse apenas por uma tarde.
Enquanto o mundo girava velozmente.
Seria o mesmo que ignorar as ondas.
Por onde a vida amálgama sem tempo.
Um pouco de cada fragmento.
E em sua própria inquietude.
Acalma.

Veja bem.

Ai de ti, Copacabana!

Ai de ti, Copacabana! (Rubem Braga – Rio, Janeiro, 1958)

1. Ai de ti, Copacabana, porque eu já fiz o sinal bem claro de que é chegada a véspera de teu dia, e tu não viste; porém minha voz te abalará até as entranhas.

2. Ai de ti, Copacabana, porque a ti chamaram Princesa do Mar, e cingiram tua fronte com uma coroa de mentiras; e deste risadas ébrias e vãs no seio da noite.

3. Já movi o mar de uma parte e de outra parte, e suas ondas tomaram o Leme e o Arpoador, e tu não viste este sinal; estás perdida e cega no meio de tuas iniqüidades e de tua malícia.

4. Sem Leme, quem te governará? Foste iníqua perante o oceano, e o oceano mandará sobre ti a multidão de suas ondas.

5. Grandes são teus edifícios de cimento, e eles se postam diante do mar qual alta muralha desafiando o mar; mas eles se abaterão.

6. E os escuros peixes nadarão nas tuas ruas e a vasa fétida das marés cobrirá tua face; e o setentrião lançará as ondas sobre ti num referver de espumas qual um bando de carneiros em pânico, até morder a aba de teus morros; e todas as muralhas ruirão.

7. E os polvos habitarão os teus porões e as negras jamantas as tuas lojas de decorações; e os meros se entocarão em tuas galerias, desde Menescal até Alaska.

8. Então quem especulará sobre o metro quadrado de teu terreno? Pois na verdade não haverá terreno algum.

9. Ai daqueles que dormem em leitos de pau-marfim nas câmaras refrigeradas, e desprezam o vento e o ar do Senhor, e não obedecem à lei do verão.

10. Ai daqueles que passam em seus cadilaques buzinando alto, pois não terão tanta pressa quando virem pela frente a hora da provação.

11. Tuas donzelas se estendem na areia e passam no corpo óleos odoríferos para tostar a tez, e teus mancebos fazem das lambretas instrumentos de concupiscência.

12. Uivai, mancebos, e clamai, mocinhas, e rebolai-vos na cinza, porque já se cumpriram vossos dias, e eu vos quebrantarei.

13. Ai de ti, Copacabana, porque os badejos e as garoupas estarão nos poços de teus elevadores, e os meninos do morro, quando for chegado o tempo das tainhas, jogarão tarrafas no Canal do Cantagalo; ou lançarão suas linhas dos altos do Babilônia.

14. E os pequenos peixes que habitam os aquários de vidro serão libertados para todo o número de suas gerações.

15. Por que rezais em vossos templos, fariseus de Copacabana, e levais flores para Iemanjá no meio da noite? Acaso eu não conheço a multidão de vossos pecados?

16. Antes de te perder eu agravarei tua demência — ai de ti, Copacabana! Os gentios de teus morros descerão uivando sobre ti, e os canhões de teu próprio Forte se voltarão contra teu corpo, e troarão; mas a água salgada levará milênios para lavar os teus pecados de um só verão.

17. E tu, Oscar, filho de Ornstein, ouve a minha ordem: reserva para Iemanjá os mais espaçosos aposentos de teu palácio, porque ali, entre algas, ela habitará.

18. E no Petit Club os siris comerão cabeças de homens fritas na casca; e Sacha, o homem-rã, tocará piano submarino para fantasmas de mulheres silenciosas e verdes, cujos nomes passaram muitos anos nas colunas dos cronistas, no tempo em que havia colunas e havia cronistas.

19. Pois grande foi a tua vaidade, Copacabana, e fundas foram as tuas mazelas; já se incendiou o Vogue, e não viste o sinal, e já mandei tragar as areias do Leme e ainda não vês o sinal. Pois o fogo e a água te consumirão.

20. A rapina de teus mercadores e a libação de teus perdidos; e a ostentação da hetaira do Posto Cinco, em cujos diamantes se coagularam as lágrimas de mil meninas miseráveis — tudo passará.

21. Assim qual escuro alfanje a nadadeira dos imensos cações passará ao lado de tuas antenas de televisão; porém muitos peixes morrerão por se banharem no uísque falsificado de teus bares.

22. Pinta-te qual mulher pública e coloca todas as tuas jóias, e aviva o verniz de tuas unhas e canta a tua última canção pecaminosa, pois em verdade é tarde para a prece; e que estremeça o teu corpo fino e cheio de máculas, desde o Edifício Olinda até a sede dos Marimbás porque eis que sobre ele vai a minha fúria, e o destruirá. Canta a tua última canção, Copacabana!

De volta envolta

Deixe-me pensar.
Pois sempre algo foge do olhar.
Coisa que não sou mais.
Coisa que semeia e vai.
E estou indo todo o tempo.
E chegando de certa forma.
Entre dias e noites me perco.
Tecendo a malha intocada.
Sutilmente transformando.
Como num sopro de palavras.
E suas milhares de moléculas.
Desaguando no ar.
Rasurando caminhos.
Dando voltas ao mundo.
Numa corrente que gira.
Na cadência ideal.
Que sai faísca e enxágua.
Que clareia e ofusca.
Que arrepia e faz suar.
Por um dado momento.
São essas coisas que não compreendo.
E, bem queria saber.
Coisa que doí mas cura.
Que volta envolta.
Deixe-me pensar.

O jogo do teatro

De repente, um olhar vazio.
Um ar de mistério ameaça.
Uma noite inteira.
O que eu disse,
Que te causou tal silêncio?

Da garganta ressecada.
Ao suor morno, quente e frio.
Numa química inexplicável.
De quando demos as mãos.
Ensaiando um ato de ajuda.
Então te abracei forte
Pra dizer bem alto.
Que juntos jamais perderemos.
E se errei, isso não se faz.

Então me mostra como deve ser.
Me ensina, me ganha, me quebra.
Pois esse jogo sem naipe, sem regras.
De silêncio e bocas caídas de nada vale.

Reis sem rostos, rainhas desvalidas.
Um teatro de mascaras tristes.
Onde num riso dramático.
Blefa a batida de mãos quase vazias.
E sobram trincas de ases pra descartar.
Do que ficou espalhado na mesa.
Que você comprou do resto.
Das mãos que nem você percebeu.
Despindo você um pouco a cada jogada.

Sem vencedores, nem atores.
Apenas canastras sujas.
O fim dos atos.

O medo de falar de amor

Eu nunca tive medo.
Longe de mim, temer.
Falar de amor faz parte.
Pois em qualquer parte se faz amor.

Mesmo no suicídio da loucura.
Eu doei e odiei por amor.
E foi mais forte que tudo.
Como correnteza brava pro mar.
E se foi num vortex.
Minucioso, lento, ao invisível.

Eu nunca temi o amor.
Mas agora é verdade.
Pelo menos por algum tempo.
Pois sei que de qualquer parte.
Se faz amor.

Quase Nada – Um sonho

Uma das coisas mais bonitas que ouvi.
Foi você me chamar, pra falar em seu ouvido.
Qualquer coisa da minha voz.
Qualquer coisa, mas eu disse quase nada.

Uma das coisas mais bonitas que ouvi.
Foi você dizer que me amava além de tudo.
E de novo eu disse quase nada.
Qualquer coisa sussurrada.

Uma das coisas mais bonitas que ouvi.
Foi quando você parou e me disse nada.
Apenas um beijo no rosto, roçando em meu queixo.
No canto da boca quase fechada.

Uma das coisas mais bonitas que ouvi.
Foi quando me disse “Adeus!”
E partiu como fumaça que desfaz.
No leve sopro da madrugada.

Don´t Speak

You and me
We used to be together
Everyday together always
I really feel
That I’m losing my best friend
I can’t believe
This could be the end
It looks as though you’re letting go
And if it’s real
Well I don’t want to know

Don’t speak
I know just what you’re saying
So please stop explaining
Don’t tell me cause it hurts
Don’t speak
I know what you’re thinking
I don’t need your reasons
Don’t tell me cause it hurts

Our memories
Well, they can be inviting
But some are altogether
Mighty frightening
As we die, both you and I
With my head in my hands
I sit and cry

Don’t speak
I know just what you’re saying
So please stop explaining
Don’t tell me cause it hurts (no, no, no)
Don’t speak
I know what you’re thinking
I don’t need your reasons
Don’t tell me cause it hurts

It’s all ending
I gotta stop pretending who we are…
You and me I can see us dying…are we?

Don’t speak
I know just what you’re saying
So please stop explaining
Don’t tell me cause it hurts (no, no, no)
Don’t speak
I know what you’re thinking
I don’t need your reasons
Don’t tell me cause it hurts
Don’t tell me cause it hurts!
I know what you’re saying
So please stop explaining

Don’t speak,
don’t speak,
don’t speak,

A correnteza

Por onde você andava, quando pedi pra voltar?
Por onde você divagava, quando pedi pra pensar?
Por onde você amava, quando pedi pra me amar?
Qual caminho escolheu, eu não sei.

Por onde sussurrava, quando pedi pra cantar?
Por onde dormia, quando pedi pra sonhar?
Por onde falava, quando pedi pra me contar?
Qual destino escolheu, eu não sei.

E onde você se escondia, eu não sei.
Quando te pedi pra ficar, de uma vez.
De quando te implorei, pra te ver e não vi.
Qual caminho então, você disse:

“Que o melhor é deixarmos pra trás,
Pois de todas as pedras que joguei,
E de todas as pétalas que arranquei,
Do bem me quer sequer desfolhei!”

E agora o que resta, sou eu.
Do que sobrou de nós, eu não sei.
Num mar de rosas, um botão.
Que na correnteza, se foi.

Um incerto obscuro

Não faça assim tão depressa.
Só te peço que me entenda.
Apesar de todas as promessas.
Pois no tempo pode estar a cura.
O remédio que a alma necessita.
Injetado na corrente do meu corpo.
Que nunca cessa, apenas renova.
Que me prende e livra a todo instante.
Enlaçada num coração apertado.
Num prolapso mitral.
Silenciosamente.

Eu te peço pra ficar.
Pois fora de mim, existe você.
E aqui dentro, também.
Pois apesar de tudo, eu acredito.
Que mesmo quando não há nada.
Ainda existe uma saída.
Que nunca cerra, mas se esconde.
Está sempre ali, mas não descobrimos.
Encoberta por um pano branco.
Num translúcido vitral.
Caprichosamente.

A Fonte

Minha princesa veio de longe.
Sedenta, esperançosa.
Cansada de tanto penar.
Na dolorosa corcova da vida.

Assim com eu, por outro rumo.
Sedento, esperançoso pro mar.
Cansado de tanto pesar.
Pelas curvas sinuosas da vida.

A apesar de tudo, de todos.
Sem pensar caminhamos juntos.
Como fogo e água, soleira e luar.
Bebendo pouco, peneirando nada.

Mas no passo inconseqüente da vida.
Acabamos num mesmo lugar.
Eu te dou um pouco de mim.
Você me mostra por onde andar.

Enfim, voltamos ao início.
Depois de uma longa jornada.
Pra recomeçar tudo novamente.
Sem casa, sem rancor, sem lar.

Vergonha

Eu tenho vergonha.
Por não te dizer coisas “sem vergonha”.
De não ter roubado um beijo seu.
Naquela tarde em que ficamos, de repente, em silêncio.

Eu não tinha nada a perder.
Mas tive medo de você.
De que nunca mais na vida,
Olhasse pra mim do mesmo jeito.

Eu tenho esse defeito.
Esquecer que a vida é o momento.
E desperdiço meus sonhos.
Pelo medo do “não”.

Se pudesse fazer diferente, seria um ladrão.
E destemido te diria qualquer bobagem.
Tentaria te seqüestrar num crime sem fiança.
Mesmo que a pena máxima fosse sua indiferença.

Preciso acreditar que exite recompensa:
A certeza exata do desejo sincero.
E que amanhã ainda estarei vivo.
E tudo pode mudar

Por que não?

Você não tenta, não experimenta.
Fica aí parado, entrevado.
Olhando o tempo passando intenso.
Esperando para sempre.

Abra seus olhos, nervos e janelas.
Que se dane a calma, os lamentos da alma.
Brinde ao fim dos tempos que já se foram!
Pois há muito pouco tempo.

E num segundo, diga “sim”.
Arremessa uma mensagem.
Nesse imenso oceano invisível.
E deixe-a navegar sozinha.

Aportar em qualquer fim, finalmente.
Mas seja como for, que seja assim.
Clandestinamente, sem esperança.
Pois sempre haverá um destino.

Alguém esperando um palavra.
Um sonho, uma semente, uma resposta.
O desejo reprimido de pedir perdão.
Por que não?

Útero

Sei que não soube.
Perdemos a conexão.
Umbilical, serviçal.
Trocando milagres.

Pouco nos vimos,
Muito nos demos.
Usei a seiva mãe.
Pra me nutrir.

E no ato.
Crescente.
Embebido em colo.
Incipiente.

Já fui, já era, já sou.
Errei, sofri, no dolo.
Por sua causa.
Me revirei, chutei.

Porque a vida.
Não há fim, nem saída.
Porta, nem tranca.
Contrai e expulsa.

Até quando puder.
Enquanto estiver.
A beira do próximo.
Amanhecer.

E se for diferente.
Que seja noturno.
Ao menos silencioso.
Despido de tudo.

Rumos e rumores

Ao lado, uma proposta para ir.
Do outro, uma para ficar.
No meio do caminho um presente.
Uma história inacabada.
Que começou do nada.
Entre lençóis e promessas.
Deixados para sempre.
Entre quatro paredes.
Que, por sinal, não existem mais.

E assim, tudo foi acontecendo.
Como nuvem púrpura.
Que sem mais nem menos, vai.
Corre no vento dessa madrugada.
Trazendo, mais uma vez, a chuva.
E levando lentamente meu olhar.
Nos segundos de contemplação.
Mais um instante da minha vida.
Entre quatro paredes.
E, diga-se de passagem, encardidas.

Trago, mais uma vez, a chuva.
Contemplo outro olhar.
Entre novos lençóis e promessas.
Que sem menos nem mais.
Repetimos, sonhamos, torcemos.
Rumores pairam sobre minha mente.
Sem rumo, sem nexo.
Nas noites mal dormidas.
Do sonho inacabado, que ronda
E, como sina, jamais termina.

Se eu morrer de amor, não repare.

Se eu morrer de amor, não repare.
Sou apenas um poeta delirante.
Que ao mínimo afago de carinho.
Em seu pescoço me declaro.

E foste num sonho retumbante.
Que te vi pela última vez.
Em pé, ajoelhado ao seu lado.
Clamando por um pouco do que foi.

Daquilo que passou como vulto acuado.
Na chama que tremulava ostentada.
Do beijinho fraterno pela noite.
Chora um passado tão presente.

E você é minha bela ao acaso.
Que encontro longe do teu lado.
E não espero nada além de tudo.
E do nada me declaro.

Se eu morrer de amor, não repare.
Era apenas um descanso de momento.
Que invento, pois te invento.
Toda noite ao meu lado.

Coletânea de Frases 1

“Hoje me dia está difícil acreditar em qualquer coisa que a gente ouve, pois a gente ouve tanta coisa inacreditável.”

“A endorfina é linda”

“Quem cansa nunca alcança”

“Se não fizermos uma loucura de vez em quando, acabamos loucos!”

“Todo músico profissional deveria ter seu papel timbrado.”

“O óbvio é tão óbvio, que as vezes atrapalha”

“Vendedor e Motorista de Taxi: se não prestar atenção, acaba indo pelo caminho que eles querem.”

Little Dove

Ela caminha através de nuvens.
Mi Madre, I miss you so much…
Exuberante, ao vento, tão perfeita.
Sem qualquer defeito, te amo.

Faz seu esboços inacabados em lápis.
Dourando no horizonte eterno.
Na pele morena e cabelos tão longos.
Pairando ao vento! Ah… tão bela!

Aquela manhã, inacabada foi o fim.
E o começo de uma jornada.
Que deixou tantos amores cálidos.
Tantas pétalas pálidas de saudade.

Mas infalível, ainda pertence a este mundo.
Por trinta anos eu te carrego no peito.
E por maior tristeza que essa ausência me cause.
Ainda te amo, para sempre.

O Caso

Foi assassinato.
Dois corpos estendidos.
Deixados ao abandono.
E eram os nossos.

Foi suicídio sim.
Mesmo que sem querer.
Destravamos o cão.
Apertamos o gatilho.

E sem sentir, a queima roupa.
No meio do meu coração.
Nos acertou em cheio.
Abraçados e cúmplices.

Ali mesmo, na Sala de Estar.
Estivemos pela última vez.
Sem trocar olhares.
Apenas silêncio.

E na cena do crime, ficou o giz.
Da nossa silueta esparramada.
Que se apagou para sempre.
Como nuvem no vento.

Caso resolvido.

A cegueira

Você fez tudo pra mim e não vi.
Disse o necessário e eu menti.
Abraçou meus sonhos como verdade.
Beijou meu rosto só pra me acalmar.

Você me disse pra voar e fui.
E eu, nunca te pedi pra ficar.
Me disse o que fazer para fugir.
Mas eu nunca soube sair do lugar.

Não tracei meu caminho.
Parece longa essa caminhada.
E perdi o rumo de mãos dadas.
Contigo.

Mas você voltou mais forte.
E alimentou meu ser.
Disse tudo aquilo novamente.
E me perdoou.

Por isso tudo e por tudo que não via.
Só agora, e tarde, te agradeço.
E juro, nem sei se mereço.
A cura pra minha cegueira.

Abismo

Eu me concentro.
Olho para o fim.
E suspiro…
Vejo rostos.
Sinto cheiros.
E abraços.
Então refuto.

Entre o sim e o não.
Existe um abismo.
De átomo, elétrons e prótons.
Neutrinos! Uma força pagã.
Que compulsivamente.
Amálgama.

Assim somos nós.
Pequenas partes do infinito.
Aonde co-existem Deuses,
Ciência e alívio.
Que, como não se bastassem.
Ainda me acalmam.

À beira de mim.
Me calo e clamo.
Inclinado e de joelhos.
A beira do horizonte.
Peço perdão.
A quem puder me ouvir.

À beira do horizonte.
O Sol já me basta.
Numa lição de sutileza.
De energia infinita.
De mormaço.
E razão.

Não sei.

Não me leve a mal.
Mas hoje estou péssimo.
Não quero soletrar seu nome.
Ao menos contar sobre o meu dia.
Que foi longo e morno.

Eu não sei sobre tanta coisa.
Sei quase sobre nada.
Apenas murmuro seu nome.
Com palavras quase noturnas.
Amenas como o outono.

Apenas não sei se devo.
Se posso ou se nego
Mas sendo sincero me entrego.
Sem saber de tudo.
Por nada.

Depois da Tempestade

Os sonhos fizeram as pazes comigo.
Pesadelos agora são nuvens brancas.
Que pairam como algodão num céu azul.

E o infinito, que um dia jurei fatal.
Agora me inunda de vida e promessas.
Como quem me diz sempre “sim”.

Extremamente longe eu me vi passar.
Gigante, deitei calmo na linha do horizonte.
E dormi ao relento, impávido sob o crepúsculo.

Esperando amanhecer.

De Passagem

Hoje falei contigo apenas para dizer nada.
Como quem precisa saber que está lá.
A segurança da distância calculada.
Me protege de qualquer dor.

Ainda com vestígios de silêncio.
Velados no auge da madrugada.
Nas entrelinhas de pegadas.
Quase apagadas pelo tempo.

Não sofro mais tanto quanto antes.
Apenas um martírio de minutos.
Uma bobagem, uma chuva de verão.
E isso é até confortante, não?

Hoje falei contigo apenas para dizer nada.
Apenas pra voltar na página virada.
Na ferida mal cicatrizada que arde.
Que incomoda como farpa.

E folhear novamente, para frente.
Sem dizer nada, como tem que ser.
Apenas de passagem.
Eu continuo.

A Vida

Por vezes penso que a vida é um suspiro.
Uma mensagem ou apenas uma citação.
Separada por vírgulas e pontos finais.
Uma cena de romance ou documentário.
Um festa de louvores em um mar de rosas.

Por vezes acredito no quem nem sei.
E admito que errei em vão na promessa.
No amor indecifrável achei que saberia,
Andar pelo quatro cantos da paixão,
Sem me perder em mim.

Por vezes escrevi tantas frases.
Caminhei por onde caminharam.
Recebi a graça do vento no olhar.
E a sombra da divina luz que me aquece.
E renova a chama que arde sem parar.

Por vezes destilei o cúmulo do sonhar.
Em visões tão verdadeiras que inebriam.
Mas se não é, por fim, essa a verdade.
Prefiro então não mais pensar.
Na beleza que é viver.

O Super-Humano

Rápido e impreciso.
De acento errado, comunica.
Na palavra batida, discursa.
Com a mão cerrada, conclama.
E de mãos abertas, exclama.

Voa até o infinito e volta.
Levando o mundo nas costas.
Ressuscita do albergue.
Das mais profundas ilusões.
E repousa celeste, na cama.

Arredio e trêmulo.
Ao pé do limoeiro, há sombra.
Voltando ao passado, discursa.
Com a mão na cabeça, duvida.
Se ao errar tanto, foi humano.

Sem mais temores e incrédulo.
Ainda ouve Suzana chamando.
De mãos espalmadas, a prece.
No mínimo pendura o terço.
De punhos unidos, pede.

Trancado há três dias no quarto.
Vestem seu rosto, sem pressa.
Sem capa e imortal, descansa.
De olhos abertos, espanta.
A salvação então, acontece.

Saudade Distante

Pra que essa saudade,
Esse domínio forte.
Que me arranca o sono.
E perturba a calma?

Deve ser um castigo.
Uma herança pré-histórica.
Alguma droga poderosa.
Que envenena…
Engana olhos e coração.
E se diverte contigo.
Machucando aos poucos.
Em todos os momentos.
Mesmo em silêncio.
Sussura alto.
Bate forte.
Deve ser um castigo.
Que dorme comigo.

Humildade

A humildade é uma coisa boa.
Parece uma coisa à toa.
Pequena e imensa.
Infinitamente densa.
Explode no caos.
Revela-se num gesto.
No encanto.
Recatada e breve.
Simples palavra.
Retumbante.
Ação.

Pode calar um trovão.
Transformar diamantes.
Em mirra, incenso e pão.
Desafia qualquer labuta.
Em silêncio se basta.
Descalça, desnuda.
Sem palavras.
Revela milagres.
Nem sim, nem não.
Deslumbrante.
Doação.

Mensagem para você

Perdão.
A dor de dizer adeus,
É tão dura.
Que não há cura.
Senão o tempo.

Perdão.
Por não ser seu.
Para o resto da vida.
Desfazer o sonho.
Que um dia brindamos.
E tantos foram os dias.
Que nos amamos.

Perdão.
Pela falta de carícias.
Por não saber entender.
O que faltava para você.
Pela minha imaturidade.
Pelas minhas demências.
E por tudo que não vi.

Perdão.
Eu quis cuidar de você.
Mas não soube cuidar de mim.
Se é que existe verdadeiro perdão.
Para quem amou demais.
Amou você.
Depois de tudo e do nada
Não haverá.
Jamais.

O dia em que for embora

Nesta hora quero estar bem longe.
A milhares de quilômetros de mim.
Não fugirei de nada,
Mas nem estarei aqui.
Serei patético, estátua, paralizado.
Não terei coragem de pronunciar seu nome.
Não farei qualquer oração.
Apenas pensarei por alguns instantes.
E lembrarei de tudo com amor.
Partirá meu coração e meu mundo.
Serei demolido e totalmente aniquilado.
Estarei plantado sobre meus pés.
Amarrado em puro sofrimento.
Não farei a mínima questão.
De mostrar coragem.
Conter emoção.
Apenas pasmo.
Rasgante emoção.
Que fere e dói demais.
Somente em pensar.
Aqui dentro.
Do meu coração.
Que um dia irá.
Embora daqui.

Meu Pai – 2

Se existe algo que admiro.
É tua força, teu semblante.
Lindo e forte, trêmulo e exato.
Amável e doce como pluma.
Sensível como seda.
Me suporta apenas com a força.
Da tua calma, que acalma.
Qualquer tempestade.

Se existe algo incomensurável.
É tua imensidão inextinguível.
Inenarrável, insuperável ao máximo.
Super herói, que sobrepuja
Qualquer outro herói.
Das estórias que ouvi.
Pois a tua mão amansa.
Qualquer desavença.
Toda tempestade.

Das coisas da vida

Outro dia te vi passar.
Rasgando flores ao seu pesar.
E inodoro, insípido era o olhar.
De que não ama a si próprio.
Nem ao menos um instante.

Busca ao acaso, insensato destino.
Doce e carente; amarrado semblante.
Regado do puro e insano eterno alívio.
De quem busca carente.
Num incesante alívio.
A cura pras coisa da vida.
Das coisas da vida.
Coisas da vida.
Da vida.

Nao fale assim do amor

Você diz o que quer e o que é.
Mas esquece que o importante é o amor.
Se você pensa que não sei ser o que sou.
Não entende que o importante é o amor.

E o que importa é amor.
Se não está presente não vale uma flor.
O que importa é o amor, é o amor, é amor!
Dedicado intrépido, impávido amor.

Mesmo cercado, arrebatado o amor.
Se mistura na dor de quem ama, é o amor.
Se dúvida que o amor é amor.
Então se tranca no fundo, no coração.

É amor, é amor.
Que desfaz toda fúria é o amor.
Se não entende a verdade, busca teu amor.
E se cala na fúria insana do amor.

É amor, o amor, é o amor.

Ah… Rubem Braga!

SOBRE O AMOR, ETC. (Rubem Braga)

Dizem que o mundo está cada dia menor.

É tão perto do Rio a Paris! Assim é na verdade, mas acontece que raramente vamos sequer a Niterói. E alguma coisa, talvez a idade, alonga nossas distâncias sentimentais.

Na verdade há amigos espalhados pelo mundo. Antigamente era fácil pensar que a vida era algo de muito móvel, e oferecia uma perspectiva infinita e nos sentíamos contentes achando que um belo dia estaríamos todos reunidos em volta de uma farta mesa e nos abraçaríamos e muitos se poriam a cantar e a beber e então tudo seria bom. Agora começamos a aprender o que há de irremissível nas separações. Agora sabemos que jamais voltaremos a estar juntos; pois quando estivermos juntos perceberemos que já somos outros e estamos separados pelo tempo perdido na distância. Cada um de nós terá incorporado a si mesmo o tempo da ausência. Poderemos falar, falar, para nos correspondermos por cima dessa muralha dupla; mas não estaremos juntos; seremos duas outras pessoas, talvez por este motivo, melancólicas; talvez nem isso.

Chamem de louco e tolo ao apaixonado que sente ciúmes quando ouve a sua amada dizer que na véspera de tarde o céu estava uma coisa lindíssima, com mil pequenas nuvens de leve púrpura sobre um azul de sonho. Se ela diz “nunca vi um céu tão bonito assim”, estará dando, certamente, sua impressão de momento; há centenas de céus extraordinários e esquecemos da maneira mais torpe os mais fantásticos crepúsculos que nos emocionaram. Ele porém, na véspera, estava dentro de uma sala qualquer e não viu céu nenhum. Se acaso tivesse chegado à janela e visto, agora seria feliz em saber que em outro ponto da cidade ela também vira. Mas isso não aconteceu, e ele tem ciúmes. Cita outros crepúsculos e mal esconde sua mágoa daquele. Sente que sua amada foi infiel; ela incorporou a si mesma alguma coisa nova que ele não viveu. Será um louco apenas na medida em que o amor é loucura.

Mas terá toda razão, essa feroz razão furiosamente lógica do amor. Nossa amada deve estar conosco solidária perante a nuvem. Por isso, indagamos com tão minucioso fervor sobre a semana de ausência. Sabemos que aqueles 7 dias de distância são 7 inimigos: queremos analisá-los até o fundo, para destruí-los.

Não nego razão aos que dizem que cada um deve respirar um pouco, e fazer sua pequena fuga, ainda que seja apenas ler um romance diferente ou ver um filme que o outro amado não verá. Têm razão; mas não têm paixão. São espertos porque assim procuram adaptar o amor à vida de cada um, e fazê-lo sadio, confortável e melhor, mais prazenteiro e liberal. Para resumir: querem (muito avisadamente, é certo) suprimir o amor.

Isso é bom. Também suprimimos a amizade. É horrível levar as coisas a fundo: a vida é de sua própria natureza leviana e tonta. O amigo que procura manter suas amizades distantes e manda longas cartas sentimentais tem sempre um ar de náufrago fazendo um apelo. Naufragamos a todo instante no mar bobo do tempo e do espaço, entre as ondas de coisas e sentimentos de todo dia. Sentimos perfeitamente isso quando a saudade da amada nos corrói, pois então sentimos que nosso gesto mais simples encerra uma traição. A bela criança que vemos correr ao sol não nos dá um prazer puro; a criança devia correr ao sol, mas Joana devia estar aqui para vê-la, ao nosso lado. Bem; mais tarde contaremos a Joana que fazia sol e vimos uma criança tão engraçada e linda que corria entre os canteiros querendo pegar uma borboleta com a mão. Mas não estaremos incorporando a criança à vida de Joana; estaremos apenas lhe entregando morto o corpinho do traidor, para que Joana nos perdoe.

Assim somos na paixão do amor, absurdos e tristes. Por isso nos sentimos tão felizes e livres quando deixamos de amar. Que maravilha, que liberdade sadia em poder viver a vida por nossa conta! Só quem amou muito pode sentir essa doce felicidade gratuita que faz de cada sensação nova um prazer pessoal e virgem do qual não devemos dar contas a ninguém que more no fundo de nosso peito. Sentimo-nos fortes, sólidos e tranqüilos. Até que começamos a desconfiar de que estamos sozinhos e ao abandono trancados do lado de fora da vida.

Assim o amigo que volta de longe vem rico de muitas coisas e sua conversa é prodigiosa de riqueza; nós também despejamos nosso saco de emoções e novidades; mas para um sentir a mão do outro precisam se agarrar ambos a qualquer velha besteira: você se lembra daquela tarde em que tomamos cachaça num café que tinha naquela rua e estava lá uma louca que dizia, etc., etc. Então já não se trata mais de amizade, porém de necrológio.

Sentimos perfeitamente que estamos falando de dois outros sujeitos, que por sinal já faleceram – e eram nós. No amor isso é mais pungente. De onde concluireis comigo que o melhor é não amar, porém aqui, para dar fim a tanta amarga tolice, aqui e ora vos direi a frase antiga: que é melhor não viver. No que não convém pensar muito, pois a vida é curta e, enquanto pensamos, ela se vai, e finda.

Maio, 1948.

Extraído do livro 200 Crônicas Escolhidas. As melhores de Rubem Braga. 4a edição. P. 87.

Nas chamas do Hindemburg

Ouço Led e “Os Besouros”
E me pergunto o que há além?
Estavam many miles away from here.
Literalmente longe e perto d’alma.
Que havia de sobra
E já nem encarna mais.
Na flauta e distorção.
Havia silêncio e pausa.
Analógicos e sem bits.
Solos duplos de guitarra.
Sujos e brilhantes.
Oh, my Lord, my sweet Lord,
Onde está a velha escada pro céu?

Se as folhas continuam caindo.
Ainda acredito em backing vocals de anjos.
Soprando no vendo respostas.
De fato algo se perdeu no caminho.
Desde a faixa do pedestre descalço.
Até na escada-rolante que me leva.
Na língua de pedra que te fere.
Tudo consumido nas chamas pesadas.
Digitalizadas sem drama.
Em “zeros e uns”, poucos loucos.
Sobreviventes do último Hindemburg.

Pequenos movimentos

Um vídeo escolhido.
Pra gente ver a noite.
Nada pra fazer.
A não ser, você.

Uma piada ou trocadilho…
“Já fechou a janela da sala?”
“Você não vem dormir?”
Pequenos movimentos…

Beijo, cabelo, carinho.
Corpo, cheiro e voz.
Que falta me faz…
Saudade e ausência.
Nós.

Letras espalhadas em teclas.
Um fone de ouvido.
Uma linda canção.
Algumas cervejas.
E uma (in)certa… razão.

 

A Milésima Loucura

O que há por dentro desta alma que não sacia?
Desta busca pelo que não há domínio?
É sabido que há cálidas rosas entre barras de ferro enrustidas.
Em berços de deusas trêmulas adoradas em agonia.
De secos calcanhares descalços há vera ferida.
Ah.. seu louco saco sem fundo e sem juízo!
Além do que imagina, se já não bastasse, há tua própria “insolidez”.
Que mantida em segredo desnuda a própria alma e carne.
E descamba para a mais turva das entrelinhas.
E em sonhos morrerá de amores estranhos por ti.
Deixando um eterno e morno descanço.
Ah… loucura, o que há de interessante eu não sei.
Mas que existe um tanto de veracidade entre seus discursos, eu vi.
E dizem por aí que mais normais são as tuas faculdades.
Mesmo que cravadas ao punho na cruz de punhal.
E ferido arde com medo e desejo.
Que tudo isso seja tão importante, certeiro e vão.
Quanto a busca da liberdade tardia.
Da eterna crueladade do não saber.
Do que sequer ao menos valia.

O Grande Espaço Entre o Céu e a Terra

Não precisa gritar, mas se quiser e for melhor assim.
Que seja tão forte que faça soltar toda sua fúria.
De demasiadas lamúrias, despejadas e encenadas em seus dramas pessoais.
Desde quando disseram que não te amavam só para brincar.
Quando não te abraçaram de propósito só para te abandonar.
Ou te deixaram no escuro apenas pra ver sua cara boba de medo.
Ainda que tudo isso nunca tenha sido assim, tão pungente.
Isso! Esmurra essa porta que não se abre nunca.
Apaga aquela luz que pisca em seus olhos e não te deixou dormir nunca mais.
Grita, mesmo que o espaço tenha se tornado imensamente vago.
E tudo isso talvez nunca tenha sido assim, desse jeito.
Pois há um enorme vácuo entre o céu e a terra.
Onde no espaço nem ao menos propaga.
E de repente tudo silencia.

Sem Título

Me entitulo não sei quem.
Quem me dera ser alguém.
Ter um Samba ou um Rock.
O que me importa dar IBOPE?
Não me venha com uma rima.
Que eu rimo dissimulado.
Pra ver só se dá no rítimo.
Ou se rola um improvísimo.

Ou.. Ou.. Ou.. Ou…
A mensagem é improvável.
Ser o último indivisível.
Átomo, ótimo ou íntimo.
Na levada eu nego o óbvio.
Já que o mundo é inegável.
Resta da alma o suplício.
Acentado eu me conforto.
Quem diria que não digo.
Vai aí um imporviso?

Então aviso amigo sou.
Pois quem avisa amigo é.
E amigo não deslisa.
Nem sequer desmoralisa.
E continuo obediente.
Entre pauta, puta e metricá.
Mora afora, aflora e agora.
Um minuto pro impossível.

Quem me dera ser alguém.
Algemado eu suplico.
Beija minha face.
Cura o meu martírio.
E indescente eu me retiro.
Com vergonha eu me descalço.
E deito manso em leito calmo. 
Forrado, rotulado: Maurício.

Meu Pai

Meu pai.
Me escuta calado.
Tu és quem transforma.
O semblante turvo;
Em face ávida.
Dos deuses do mundo.
Da terra és um só.
Sonoro e plácido.
Tu perdoas sempre.
E sempre incansável.
Forte e adiante.
Não há obstáculo.
Nem ao menos penúria.
Ah… pai,
Me acolhe tão límpido.
Que morreria em teus braços.
Mas não mereces esta agonia.
Eu prefiro viver por ti.
Pois ao longo deixaste.
Impregnado no mundo.
Minha breve viagem.

Melhor Assim

Ama a ti mesmo antes que o drama te castigue.
Antes que a trama te domine e amoradasse.
Vôe a caminho desde o início, que continua sempre.
Enquanto há luz e calor entre a paz que busca.
E leve, tão leve, a levada moradia que te acolhe.
Na chegada e também na saída, quase sem saída.
Tão revelante quando a foto da noite daquele dia.
Entre árvores de sonho plantada em descanso.
Espreitando o recanto da mais bela nostalgia.
E num abraço vazio me arrepio ao acaso.
Mas me curo do fadado que por muito era agonia.
Agora só e em mim, canto pra nunca mais esquecer.
Que bastam pequenas coisas para me fazer feliz.
Basta o sol se pôr para tudo começar outra vez.

Samba para nunca esquecer

O que não se paga é o que se sente.
E vale mais que presente ou moeda.
Então deixa esse trocado,
Bem aí guardado, ao meio dobrado.
Larga no bolso daquela calça.
Aquela que menos gosta.
Que fica lá fundo do armário.
E quase não alcança.
Esqueçe ali no último cabide.
Mas leva nossas cantigas na bolsa.
E na manga da roupa nova que precisou vestir,
Bem passada, vincada e sob medida para nós,
As boas memórias, estampadas no tecido,
Na pele, na alma, na palma da mão.
Na palma da mão,
Na palma da mão,
Na palma da mão.

Nature Boy (E. Ahbez) – voz: David Bowie

Para quem não conhece, esta é a letra de uma canção que já foi gravada por vários artistas, como David Bowie, Frank Sinatra, Vinícius de Moraes, Caetano Veloso, Miles Davis, Ella Fitzgerald e outros. Inclusive, faz parte da trilha do filme Moulin Rouge e foi primeiro interpretada por Nat King Cole. Quem achar na net vale a pena ouvir. É tão densa e poética a música e sua melodia que resolvi postá-la aqui como fonte de inspiração.

There was a boy…
A very strange enchanted boy.
They say he wandered very far, very far
Over land and sea,
A little shy and sad of eye
But very wise was he.
And then one day,
A magic day, he passed my way.
And while we spoke of many things,
Fools and kings,
This he said to me:
“The greatest thing you’ll ever learn
Is just to love and be loved in return.”

Traduzindo (quase ao pé da letra):

Era uma vez um rapaz…
Um tanto estranho e encantador rapaz.
Dizem que ele vagou por lugares, muito, muito distantes.
Por terras e mares.
Um pouco tímido e de olhar cabisbaixo.
Mas muito sábio era ele.
Então um dia,
O mágico dia que passou em meu caminho.

Enquanto falávamos de muitos assuntos.
Sobre tolos e reis,
Ele me disse:
“A mais grandiosa de todas as coisas que aprenderá.

É apenas amar e ser amado”

Outro belo amanhã

Tudo ao silêncio não silencia,
Se dentro de você nada cala.
E o mundo gira.
Como bola de fogo ou de neve.
Que queima e congela.
Mas ao tempo desfaz.
E não vale um minuto lembrar da dor.
Porque passará, há de passar.
Olhe o céu e sinta o vento e saberá.
Que nuvens vêm coloridas.
Trazendo a chuva que cai ao seu pesar.
E, contudo, acima de tudo, ela há de semear.
Em tantos outras terras e almas.
Silenciosa, noturna e calma.
Um novo e belo amanhã.
Que nascerá pra todos.
E tudo recomeçar.

Esqueça

Estar presente.
É necessário estar.
Ser presença de espírito.
Carne e osso maciço.
É isso, é assim, é preciso.
Como fonte que jorra na fogueira.
Jasmim que nasce em trepadeira.
Em precipícios dá vertigens.
Queima como fuligem de lareira.
Que acende a noite inteira.
Amedronta e adormece.
Por ser gigante, estremece.
De carinhos se envaidece.
E o que há de ontem,
Que não merece,
Por ser amor.
Tudo esquece.

Aprendiz

Quanto mais aprendo.
Entendo que menos sei.
E em cada dia que vai.
Tantos mitos caem.
Gestos impensados.
Carinhos mal acabados.
Brigas não seladas.
E por muito já me calei.
Por você e por mim.
Por que nunca saberei.
A medida certa.
A dose exata.
Da emoção.
Como deve ser.
Quando parar de rir.
Ou de chorar.
Exagerar ainda mais.
Enxergar além do infinito.
Para sempre serei.
Humilde, inacabado.
Eterno aprendiz.

                      Mauricio Bahia

Luabela

Papel e caneta.
Uma luz ilumina.
Da lua flutuante acima.
Através das grades.
Do andar mais alto.
Sozinho eu reflito.
E inevitavelmente
Penso na minha mulher.
Em todos os carinhos
Que dela me saciam.
Doce, como aquela lua.
É você quem prateia minha vida.
Até os caminhos do meu dia.
Pra toda noite retornar.
E me levar pra casa.
Onde moro feliz contigo.
Num lugar mais alto que o céu.
Tão perto quanto o chão.
Profundo como o mar.
Quente que nem sol.
A sua natureza é meu recanto.
Nossa cama, nosso canto.
Nela me recolho com jeitinho.
Juntando um pedacinho.
Do meu corpo no seu.
Pra te deixar dormindo.
Respirando devagar.
Flutuando em meu céu.
Serena Luabela.
Doce Isabela.
Me ilumina.

                      Mauricio Bahia

Vôo solo de Hypolito

No tablado quadrado.
Perfeito é o trajeto ensaiado.
Impossível não ficar espantado.
Movimentos acrobaticamente executados.
Minutos e  segundos cronometrados.
E no vértice do suspiro final, a explosão.
Quebrando o ar, há um corpo em contorção.
De tronco, braços, pernas, pulsos e mãos.
Equilíbrio suspenso de arte, plástica e precisão.
O tortuoso e extato vôo que toca, por fim, manso o chão.
Parado de pernas unidas é aclamada a apresentação.
A declarada poesia rimada é dedicada,
Por jus a quem conquistou a medalha dourada.
E, definitivamente, o solo gentil da pátria amada.

                                          Maurício Bahia

Hipnose Lunar

Observo a lua e suas crateras.
Impiedosamente bombardeadas no passado.
Por meteoros ou asteróides.
Imagino a lua como o amor.
Tantas vezes machucado.
Abalado e ferido.
Mas, apesar disso,
Das suas visíveis imperfeições.
Resiste a tudo e a todos.
Ainda me conquista.
E linda, hipnotiza.

 Mauricio Bahia

Um sonho de criança

O sorriso de uma criança.
É um sorriso.
Pura inocência.
De um sorriso.

Brincadeira de roda.
Outro sorriso.
Lambuzada de sorvete.
Parece que nem sente!

Pular corda e pique-esconde.
Faz manha pra mamãe ver…
Tá com sono, quer dormir.
Continua a sonhar.

Mundo colorido, pureza.
E sempre aquele sorriso.
Crescer pra que?
Ora, pra fazer criança!

 (eu e Isabela novamente. Um linha cada um.)

A Chuva

Vem chegando a chuva.
Benção do céu.
Destilada água de Deus.
Para lavar nossa alma.
Encher nossos copos.
Até transbordar.
E refrescar o corpo suado.
Limpar as impurezas.
Da sua pele.
Molhar a terra.
Serenar sob a lua.
Fazer o bem.
Enxaguar suas mágoas.
E perdoar.
Fechai vossos guarda-chuvas!

 (poesia feita “a duas mãos”.  Isabela escrevia uma linha, eu a próxima, depois ela novamente… Bincadeirinha legal!)

Para aquela que partiu

Quanto tempo e eu ainda aqui, sem te ver.
Agora, estou cansado e bebendo, pensando em você.
Tomando um drink para ‘comemorar’ a saudade.
Do pouco que me restou da sua face.
Dos pedidos para comprar cigarros.
E chamados a minha irmã na casa ao lado.
Daquela caixa de costura verde onde guardava tesouras e alfinetes.
O cavalete que, de pé, ainda apoiava a pintura inacabada.
No esboço de algo que ainda seria colorido.
 
Onde está o sangue que corria em suas veias
E pulsava em seu braço e sua voz que pouco recordo.
Cadê sua alma, ainda que em sonhos me acalma.
E sintir um pouco da sua presença tão bonita.
E tantos te amavam e era a mais querida.
Vestida em sua bata azul de céu.

Queria que me visse escrevendo esse texto.
Mas não tive tempo de fazê-lo e agora já não presta.
O que me resta é entender que a vida é mesmo assim.
Doce e repentina, como foste.

Mauricio Bahia

La Recette

Pensei em cozinhar macarrão com amor
E algum tempero, mas não sei a medida perfeita.
Então, que tal uma sobremesa de morangos aos beijos?
Talvez não seja o ideal, ainda que “trés sensual”.
Frango ao mel e carinhos, vinhos e florais aromáticos.
Humm…

Quem sabe então Nutela com seu cheiro e pele de pêssego?
Talvez mais doce fosse, se misturasse seus cabelos
De fios de ovos, e seios “pêra” numa torta perfeita, macia.
Protesto, pois “Gourmet” não sou, nunca fui, nem pretendo ser!
E, para quê tanto “mizanscene” se o que importa é amar você?
Ahhhh…

Mas, ela me pediu uma poesia de dia dos namorados.
E eu prometi um jantar neste dia doze de junho de 2007.
Que bolo…
“Mon amour”, se eu não conseguir realizar seus desejos,
Que esta poesia sacie ao menos seu coração de leão!
E eu prometo a você, aqui, neste papel,
Escolhido com carinho dentre mil-folhas.
Que para sempre um pedaço de mim será seu.

Mauricio Bahia

Amor Profundo

Profundo é o nosso amor.
Além do mundo é o nosso amor.
Imenso como mar adentro,
Que flui na correnteza sem fim.
De carne e osso é o nosso amor
E alma, silêncio e mais.
O que não tem explicação.
Nem se pode discutir.
Tão pouco é preciso divagar.
De tão certa é a certeza.
Do simples olhar.

Profundo é o nosso amor,
Como este mundo de sons e cores.
Feito perfeito pelo destino.
Incessantemente necessário,
Como dia e noite.
Soleira e luar.

Eu e você

Quando o caminho se torna um destino,
E a chuva, o vento, o mar
Se acalmam em seus lençóis.
E a terra me cerca com suas curvas.
A lua oculta, distrai nossos pensamentos.
Parece que tudo pára, tudo desaparece.
As ruas são eternamente desertas.
Totalmente nua, entre quatro paredes.
No mesmo quarto, na mesma sala,
Ao mesmo instante, a meia luz.

Mauricio Bahia

Tom

A doçura chegando,
Desperta aos poucos.
Nas teclas de um piano.
Como que brilhando na melodia.
Ao aconchego de uma viola.
Reunindo suspiros sinceros.

O ar vibra e faz música,
Que transcende sua própria existência.
E entre as frequências sonoras.
Há dedos, bocas, gestos e mumúrios.
Carinhosas cantigas em compasso.
Sopros de sol refletindo de lá
Harmonia da vida rimando de cá.

Mauricio Bahia

Parar jamais (oração para Você)

Eu agradeço pela chuva, pela luz e pela noite.
É incrível e fantástico pois tudo o que me cerca tem seu “algo”.
Obrigado por tocar minha alma com suavidade
Fazer acreditar no impossível que já é consumado, basta ver.
Eu não peço muita coisa, pois já tenho muito do que preciso.
Agradeço pelas flores, pelo mato e pelas cores.
Cada palmo dessa gravidade que me prende.
Obrigado pelos átomos que constroem e sustentam.
Pelo coração que pacientemente, pausadamente pulsa.
E bate sem parar, bate sem querer,
Sem querer parar jamais.

Mauricio Bahia

Na fotografia

Alguma coisa existe
Além do seu sorriso.
Incrivelmente diferente
De todos os outros sorrisos.
Que está incorporada
Ao momento da tua alegria
Que irradia e enlouquece
Mesmo quem a desconhece.

Alguma coisa existe,
Nessa sonora e perfeita harmonia
Que desencadeia de tua boca,
Sabiamente desenhada
Para compor um simples sorriso
Guardado para sempre na fotografia.

Mauricio Bahia

Pôr-do-sol

Havia muito tempo.
Que não escrevia.
Não destemia este impulso.
Lavava minha alma arraigada.
Entre as sombras dos pilares.
E marquises à beira mar.

Havia muito tempo.
Que não ouvia.
Qualquer cântigo de arvoredo.
Dentre as frestas e forquilhas.
Entre a cegueira causada.
Pelos holofotes da cidade.

Havia muito tempo.
Que as ondas não quebravam.
Nem a brisa e o cheiro do mar.
E a espuma que paira lentamente.
Caia em meu corpo como manto.
Envolvido pela luz amorosa do crepúsculo.

Saída

Sua chegada foi violenta.
Parecia vendaval.
Intenso e descabelante.
Rodeando como fogo.
Cegando com fumaça.
Cambalenado pernas.
Paralizando olhares.

Sua passagem foi suave.
Como nuvem no vento deslizando.
Azul claro misturado ao azul púrpura.
Muro vivo de planta que cerca.
Entrelaçando a planta dos pés.
Vivendo sem pressa.
Sem deixar ao menos aliviar.
Calando bocas.

Sua saída foi idêntica.
Àquele primeiro dia.
Intenso e insensato.
Levou tudo o que tinha.
Inclusive o que de mim faltava.
Desatou sem piedade.
Qualque parte, qualquer pedaço.
Se é que ainda existia.

Mauricio Bahia

Frágil

Sincera e frágil.
A vida que me deram.
A sombra que me segue.
Seu olhar inevitável.
A chuva que me cerca.
A cerca do seu quintal.
Que voou na ventania.
E perdeu-se para sempre.

Sincera e frágil.
Sua voz serena.
O sereno da madrugada.
E o balanço das árvores.
O quebrar das ondas.
Qualquer beijo seu.
A imensa paixão.
A paz que me causou.

Mauricio Bahia

Grito

Da tua boca calada um grito,
Um susto e um suspiro.
Do coração ferido uma dor.
Um frio e vontade de esconder.
Fugir para onde não há abrigo.
Dentro de um coração falido.
Pela demência que o próprio corpo lhe causou.
Pela falta que existia quando não chegava.
E nunca mais voltou.
Pela mudança súbita de todas as cores.
E sons e sinais e vozes.
Que antes eram bem-vindas.
Agora zumbindo em ouvidos.
Desde que você partiu .
Aquele bar e aquela esquina parecem de outros.
O que era nosso não mais me pertence.
Parece um deserto agora, do que antes era mar.
Um mar de razões para contemplar qualquer coisa.
Desde que estivesse por perto.
Para lhe escrever um pequeno recado.
Ou lhe contar o meu dia de trabalho.
Que nunca esteve tão longo e vazio.
Tão agudo e dissonante.

Medo

Ela tem medo e se esconde.
Ele tem medo e denuncia.
Ela incorpora a vítima.
Ele a renuncia.

Ela diz existir algo estranho.
Ele estranha o que havia ouvido.
Ela se faz de desentendida.
Ele então ensaia uma despedida.

Ela pede pra esperar.
Ele quer uma razão.
Ela cala por um segundo.
Ele silencia então.

Eles tencionam.
Seus lábios.
Seus olhos.
Suas pernas.
Seus corações.
Suas esperanças.
Pra aliviar essa aflição.
E soltar as palavras.
E dizer que tudo está bem.

E que assim seja:
Não precisam mais temer.

Mauricio Bahia

Infinito

No caso deste acaso,
Te falo do desconhecido.
Do outro, da outra.
Que de relance limito.
A balbuciar qualquer coisa.
Ora invento, ora imito.
Me chamam de amante,
Ou mesmo de amigo.
Me convidam pra dançar.
E te confesso ao pé do ouvido.
Que outrora te diria.
Palavras mais amenas.

Mas o tempo me ensinou
Que quem cala condena.
Por isso faço intrigas
Comigo mesmo.
E me pergunto se poderia.
Ser menos.
E nas palavras que confesso.
Meu amor mais valeria.
E agora me despeço da sinfonia.
Regida em mil versos como um dia.
Declamei minha sentença, tardia.

Agora que nem me visto,
Me vejo inteiro.
Sem perdão nem pelo.
Sem prelúdio,
Aos devaneios.
De um amor tardio.
Desatinadamente frio.

Mauricio Bahia

Guerreiros

Feri.
Com minha lança.
Que alcança meu colo.
Me perdoa Deus.
Por arremeçar por mim.
A ignorancia.
Incapaz e inconseqüente.
Eu não queria isso assim.
Desse jeito, nem para mim.
Mas o fiz passional.

Me perdoa por não amar tão belo assim.
E sangrar-me até que caia.
Até que durma sereno.
Eu preciso redimir.
De qualquer ato.
Fora de mim.

Intuição

Seu instinto é lindo,
Sua intuição é emoção.
Sua boca rima com louca.
Quase com prisão.

Tua voz é feroz quando ameaçada,
mas sempre doce e aveludada.
Você dependente de carinho.
Como um animal carente.

Me espera que já vou.
Estou preparando uma surpresa.
Estou fazendo um poema.
Sobre um tema antigo.

E você nem pode imaginar,
com o que estou rimando.
Não é com a palavra “amor”.
Nem precisaria.

Mauricio Bahia

Limite

O limite é uma asa,
Uma ponta de palito.
Uma pata de barata.
Uma bala perdida.

O limite é a dor.
Um caso de amor.
Um trote de madrugada.
Uma vida amargurada.

O limite é o medo de tentar.
É tentar sem combater,
É deter a libido,
Um consolo lascivo.

É apenas um começo,
Da fração que não termina.
Pois eterna é a dízima.
Na direção do infinito.

Mauricio Bahia

Tecnologia

Naveguei por bits infinitos.
Cortei a luz no prisma.
Curvei o espaço sideral.
Reduzi ao invisível.
Vi meu rosto no plasma.
Seus osso num raio-X.
Amanheci ainda drogado em dolantina.
Salvei tantas vidas.
Aniquilei tantas outras.
E fui amaldiçoado.
Então te levei pro espaço.
Beijei a face paralisada.
Reconstrui sua mão dilacerada.
E lambi sua voz num laserdisco.
Faço agora parte da sua vida nas cyberns.
Ainda que quanticamente incerto.
Criptografei o ódio na lápide.
Ressuscitei seu coração.
Livrei nossas mentes de seremos eternos.
Eternamente mortais sonhadores felizes.
Embaixo das marquises falsas protetoras.
Debaixo da fatídica chuva de meteoros.

Mauricio Bahia

Nós

Quando o caminho se torna um destino,
E a chuva, o vento, o mar
se acalmam em seus lençóis.
E a terra me cerca com suas curvas.
A lua oculta distrai nossos pensamentos.
Parece que tudo pára, tudo desaparece.
A rua da calçada, a varanda de minha casa.
Parece que o mundo anda descalço.
Totalmente despido.

Mauricio Bahia

Sinceridade

Eu só queria lhe dizer.
As velhas palavras de sempre.
Fazer carinhos tão simples.
Nos cabelos enrolados.
Sinceramente não preciso de muito.
Mas me diga quanto basta.
Para te fazer feliz para o resto dos dias?

Eu só queria saber.
A hora de parar e de recomeçar
Sinceramente às vezes eu me perco.
Por parecer quase impossível.
Querer tudo, todos os dias.

Vejo em mim então.
Quem espera mais do que deveria.
Sou eu também quem fantasia.
Quem cria essa necessidade.
E por isso me entrego, temo e tremo.
Longe da tua presença.
Que faz felizes todos os meus dias.

Mauricio Bahia