Sobre Nossos Pais

Você é uma expressão do universo.
Você vêm tomando forma desde o big-bang.
Você é composto de partículas de estrelas que explodiram
há bilhões de anos, e da luz do sol de hoje e de amanhã,
assim como da água da chuva que impulsiona
a semente que hidrata seu coração.
Seus ancestrais são desconhecidos, mas e daí?
Impossível é negar a sua ancestralidade.
Ela existe por si só e por todos nós.
Afinal de contas, estamos aqui.
Como negar seu tataravô?
Negar sua ancestralidade é negar a si mesmo, agora!
É por isso que honrar nossos antepassados
é uma questão de vida, de agradecimento por esta vida.
Mesmo que nunca os tenhamos visto
em carne/osso ou mesmo em forma de poeira cósmica.
É agradecer também por todos aqueles que virão.
Olhar para nossas ancestrais é visualizar uma árvore infinita de ramos
em projeção geométrica que vai além da nossa compreensão.
Nesta árvore eu te encontrei, se você não sabe.
Pois fique sabendo que um dia nos abraçamos
em algum lugar neste universo.
E é sempre bom lembrar: as partículas
da primeira explosão ainda estão por aqui,
nessa tela e dentro, além dos seus olhos.
Não tente procurar.
Apenas se lembre.
De você.

_____________

Texto inspirado na aula 7 de “O Valor dos Valores”, onde a professora de yoga e vedānta, Glória Arieira, menciona as ‘expressões deste universo’ e por Swami Dayānanda, em seu maravilhoso livro “Īśvara em Sua Vida”, quando ele escreve sobre ser impossível negar seu tataravô. Também inspirado pelo prof. Patrick van Lammeren, que na última aula de Simbolismo Védico me ensinou a olhar para a imensidão de nossos antepassados. OM!

***

“Eu saúdo a linhagem de mestres que começa com Śiva, tem Śaṅkara no meio
e vai até meu mestre.”

Das Coisas da Vida

As coisas são como elas não são.
No mundo das aparências.
O corpo manifesto na imensidão
A palavra citada é imperfeita.

Na alma do amor há sementes.
No absoluto, dissolvendo o argumento.
Como o vento manifesto na escuridão.
No silêncio da luz no infinito.

As coisas são como elas não são.
E o reflexo é a face da vida em mim.
E a vida em mim se manifesta.
Por todos os cantos do universo.

A chance

Não merecemos a chance.
Não fizemos por onde.
Desdenhamos.
E esquecemos do óbvio.
Não cuidamos.
Apontamos erros.
E os espelhos curvos mostravam.
O inverso daquilo que apontava.
E falhamos desapontados.
Amostra e isolados ficamos.
Mal avaliamos o que éramos.
E nos deixamos à deriva.
Presos ao que nos restava:
Um pouco de raiva.
Misturada ao medo.
Medo de estar errado.
Mas sem amor o que adianta?
Pois não se te coisa alguma.
Nem perdão de alma.
Nem palavra de nada.

A fuga

Seria a atmosfera,
Uma paixão fulminante,
Um susto repentindo.
Ou apenas os dias normais.O que te prende a esse mundo?

Seria a busca do conhecimento.
Pra banir essa ignorância que acorrenta?
Descalço, amordaçado sob o céu,
Com os pés plantados, ereto ao plano do olhar.
Penso que correr é a escapatoria natural.
Basta saber de quem.

Mauricio Bahia

Atemporal

Veja bem:

A vida não está no tempo.
Mas nas coisas da vida.
E quando você as olha de perto.
Percebe o que não era vazio.

Mais perto:

Tudo que era pedra, parece poesia
Aquele amor inteiro, era fragmento.
Prefiro então não te ver pelo nome.
Nem te carregar como o peso numa tristeza.
Ou flutuar na incrível leveza daquela felicidade.
Seria insano de minha parte.

Mais perto:

Pois em mim existe um mar.
E se te julgasse apenas por uma tarde.
Enquanto o mundo girava velozmente.
Seria o mesmo que ignorar as ondas.
Por onde a vida amálgama sem tempo.
Um pouco de cada fragmento.
E em sua própria inquietude.
Acalma.

Veja bem.

De volta envolta

Deixe-me pensar.
Pois sempre algo foge do olhar.
Coisa que não sou mais.
Coisa que semeia e vai.
E estou indo todo o tempo.
E chegando de certa forma.
Entre dias e noites me perco.
Tecendo a malha intocada.
Sutilmente transformando.
Como num sopro de palavras.
E suas milhares de moléculas.
Desaguando no ar.
Rasurando caminhos.
Dando voltas ao mundo.
Numa corrente que gira.
Na cadência ideal.
Que sai faísca e enxágua.
Que clareia e ofusca.
Que arrepia e faz suar.
Por um dado momento.
São essas coisas que não compreendo.
E, bem queria saber.
Coisa que doí mas cura.
Que volta envolta.
Deixe-me pensar.

O jogo do teatro

De repente, um olhar vazio.
Um ar de mistério ameaça.
Uma noite inteira.
O que eu disse,
Que te causou tal silêncio?

Da garganta ressecada.
Ao suor morno, quente e frio.
Numa química inexplicável.
De quando demos as mãos.
Ensaiando um ato de ajuda.
Então te abracei forte
Pra dizer bem alto.
Que juntos jamais perderemos.
E se errei, isso não se faz.

Então me mostra como deve ser.
Me ensina, me ganha, me quebra.
Pois esse jogo sem naipe, sem regras.
De silêncio e bocas caídas de nada vale.

Reis sem rostos, rainhas desvalidas.
Um teatro de mascaras tristes.
Onde num riso dramático.
Blefa a batida de mãos quase vazias.
E sobram trincas de ases pra descartar.
Do que ficou espalhado na mesa.
Que você comprou do resto.
Das mãos que nem você percebeu.
Despindo você um pouco a cada jogada.

Sem vencedores, nem atores.
Apenas canastras sujas.
O fim dos atos.

O medo de falar de amor

Eu nunca tive medo.
Longe de mim, temer.
Falar de amor faz parte.
Pois em qualquer parte se faz amor.

Mesmo no suicídio da loucura.
Eu doei e odiei por amor.
E foi mais forte que tudo.
Como correnteza brava pro mar.
E se foi num vortex.
Minucioso, lento, ao invisível.

Eu nunca temi o amor.
Mas agora é verdade.
Pelo menos por algum tempo.
Pois sei que de qualquer parte.
Se faz amor.

Quase Nada – Um sonho

Uma das coisas mais bonitas que ouvi.
Foi você me chamar, pra falar em seu ouvido.
Qualquer coisa da minha voz.
Qualquer coisa, mas eu disse quase nada.

Uma das coisas mais bonitas que ouvi.
Foi você dizer que me amava além de tudo.
E de novo eu disse quase nada.
Qualquer coisa sussurrada.

Uma das coisas mais bonitas que ouvi.
Foi quando você parou e me disse nada.
Apenas um beijo no rosto, roçando em meu queixo.
No canto da boca quase fechada.

Uma das coisas mais bonitas que ouvi.
Foi quando me disse “Adeus!”
E partiu como fumaça que desfaz.
No leve sopro da madrugada.

A correnteza

Por onde você andava, quando pedi pra voltar?
Por onde você divagava, quando pedi pra pensar?
Por onde você amava, quando pedi pra me amar?
Qual caminho escolheu, eu não sei.

Por onde sussurrava, quando pedi pra cantar?
Por onde dormia, quando pedi pra sonhar?
Por onde falava, quando pedi pra me contar?
Qual destino escolheu, eu não sei.

E onde você se escondia, eu não sei.
Quando te pedi pra ficar, de uma vez.
De quando te implorei, pra te ver e não vi.
Qual caminho então, você disse:

“Que o melhor é deixarmos pra trás,
Pois de todas as pedras que joguei,
E de todas as pétalas que arranquei,
Do bem me quer sequer desfolhei!”

E agora o que resta, sou eu.
Do que sobrou de nós, eu não sei.
Num mar de rosas, um botão.
Que na correnteza, se foi.

Um incerto obscuro

Não faça assim tão depressa.
Só te peço que me entenda.
Apesar de todas as promessas.
Pois no tempo pode estar a cura.
O remédio que a alma necessita.
Injetado na corrente do meu corpo.
Que nunca cessa, apenas renova.
Que me prende e livra a todo instante.
Enlaçada num coração apertado.
Num prolapso mitral.
Silenciosamente.

Eu te peço pra ficar.
Pois fora de mim, existe você.
E aqui dentro, também.
Pois apesar de tudo, eu acredito.
Que mesmo quando não há nada.
Ainda existe uma saída.
Que nunca cerra, mas se esconde.
Está sempre ali, mas não descobrimos.
Encoberta por um pano branco.
Num translúcido vitral.
Caprichosamente.

A Fonte

Minha princesa veio de longe.
Sedenta, esperançosa.
Cansada de tanto penar.
Na dolorosa corcova da vida.

Assim com eu, por outro rumo.
Sedento, esperançoso pro mar.
Cansado de tanto pesar.
Pelas curvas sinuosas da vida.

A apesar de tudo, de todos.
Sem pensar caminhamos juntos.
Como fogo e água, soleira e luar.
Bebendo pouco, peneirando nada.

Mas no passo inconseqüente da vida.
Acabamos num mesmo lugar.
Eu te dou um pouco de mim.
Você me mostra por onde andar.

Enfim, voltamos ao início.
Depois de uma longa jornada.
Pra recomeçar tudo novamente.
Sem casa, sem rancor, sem lar.

Vergonha

Eu tenho vergonha.
Por não te dizer coisas “sem vergonha”.
De não ter roubado um beijo seu.
Naquela tarde em que ficamos, de repente, em silêncio.

Eu não tinha nada a perder.
Mas tive medo de você.
De que nunca mais na vida,
Olhasse pra mim do mesmo jeito.

Eu tenho esse defeito.
Esquecer que a vida é o momento.
E desperdiço meus sonhos.
Pelo medo do “não”.

Se pudesse fazer diferente, seria um ladrão.
E destemido te diria qualquer bobagem.
Tentaria te seqüestrar num crime sem fiança.
Mesmo que a pena máxima fosse sua indiferença.

Preciso acreditar que exite recompensa:
A certeza exata do desejo sincero.
E que amanhã ainda estarei vivo.
E tudo pode mudar

Por que não?

Você não tenta, não experimenta.
Fica aí parado, entrevado.
Olhando o tempo passando intenso.
Esperando para sempre.

Abra seus olhos, nervos e janelas.
Que se dane a calma, os lamentos da alma.
Brinde ao fim dos tempos que já se foram!
Pois há muito pouco tempo.

E num segundo, diga “sim”.
Arremessa uma mensagem.
Nesse imenso oceano invisível.
E deixe-a navegar sozinha.

Aportar em qualquer fim, finalmente.
Mas seja como for, que seja assim.
Clandestinamente, sem esperança.
Pois sempre haverá um destino.

Alguém esperando um palavra.
Um sonho, uma semente, uma resposta.
O desejo reprimido de pedir perdão.
Por que não?

Útero

Sei que não soube.
Perdemos a conexão.
Umbilical, serviçal.
Trocando milagres.

Pouco nos vimos,
Muito nos demos.
Usei a seiva mãe.
Pra me nutrir.

E no ato.
Crescente.
Embebido em colo.
Incipiente.

Já fui, já era, já sou.
Errei, sofri, no dolo.
Por sua causa.
Me revirei, chutei.

Porque a vida.
Não há fim, nem saída.
Porta, nem tranca.
Contrai e expulsa.

Até quando puder.
Enquanto estiver.
A beira do próximo.
Amanhecer.

E se for diferente.
Que seja noturno.
Ao menos silencioso.
Despido de tudo.

Rumos e rumores

Ao lado, uma proposta para ir.
Do outro, uma para ficar.
No meio do caminho um presente.
Uma história inacabada.
Que começou do nada.
Entre lençóis e promessas.
Deixados para sempre.
Entre quatro paredes.
Que, por sinal, não existem mais.

E assim, tudo foi acontecendo.
Como nuvem púrpura.
Que sem mais nem menos, vai.
Corre no vento dessa madrugada.
Trazendo, mais uma vez, a chuva.
E levando lentamente meu olhar.
Nos segundos de contemplação.
Mais um instante da minha vida.
Entre quatro paredes.
E, diga-se de passagem, encardidas.

Trago, mais uma vez, a chuva.
Contemplo outro olhar.
Entre novos lençóis e promessas.
Que sem menos nem mais.
Repetimos, sonhamos, torcemos.
Rumores pairam sobre minha mente.
Sem rumo, sem nexo.
Nas noites mal dormidas.
Do sonho inacabado, que ronda
E, como sina, jamais termina.

Se eu morrer de amor, não repare.

Se eu morrer de amor, não repare.
Sou apenas um poeta delirante.
Que ao mínimo afago de carinho.
Em seu pescoço me declaro.

E foste num sonho retumbante.
Que te vi pela última vez.
Em pé, ajoelhado ao seu lado.
Clamando por um pouco do que foi.

Daquilo que passou como vulto acuado.
Na chama que tremulava ostentada.
Do beijinho fraterno pela noite.
Chora um passado tão presente.

E você é minha bela ao acaso.
Que encontro longe do teu lado.
E não espero nada além de tudo.
E do nada me declaro.

Se eu morrer de amor, não repare.
Era apenas um descanso de momento.
Que invento, pois te invento.
Toda noite ao meu lado.

Little Dove

Ela caminha através de nuvens.
Mi Madre, I miss you so much…
Exuberante, ao vento, tão perfeita.
Sem qualquer defeito, te amo.

Faz seu esboços inacabados em lápis.
Dourando no horizonte eterno.
Na pele morena e cabelos tão longos.
Pairando ao vento! Ah… tão bela!

Aquela manhã, inacabada foi o fim.
E o começo de uma jornada.
Que deixou tantos amores cálidos.
Tantas pétalas pálidas de saudade.

Mas infalível, ainda pertence a este mundo.
Por trinta anos eu te carrego no peito.
E por maior tristeza que essa ausência me cause.
Ainda te amo, para sempre.

O Caso

Foi assassinato.
Dois corpos estendidos.
Deixados ao abandono.
E eram os nossos.

Foi suicídio sim.
Mesmo que sem querer.
Destravamos o cão.
Apertamos o gatilho.

E sem sentir, a queima roupa.
No meio do meu coração.
Nos acertou em cheio.
Abraçados e cúmplices.

Ali mesmo, na Sala de Estar.
Estivemos pela última vez.
Sem trocar olhares.
Apenas silêncio.

E na cena do crime, ficou o giz.
Da nossa silueta esparramada.
Que se apagou para sempre.
Como nuvem no vento.

Caso resolvido.

A cegueira

Você fez tudo pra mim e não vi.
Disse o necessário e eu menti.
Abraçou meus sonhos como verdade.
Beijou meu rosto só pra me acalmar.

Você me disse pra voar e fui.
E eu, nunca te pedi pra ficar.
Me disse o que fazer para fugir.
Mas eu nunca soube sair do lugar.

Não tracei meu caminho.
Parece longa essa caminhada.
E perdi o rumo de mãos dadas.
Contigo.

Mas você voltou mais forte.
E alimentou meu ser.
Disse tudo aquilo novamente.
E me perdoou.

Por isso tudo e por tudo que não via.
Só agora, e tarde, te agradeço.
E juro, nem sei se mereço.
A cura pra minha cegueira.

Abismo

Eu me concentro.
Olho para o fim.
E suspiro…
Vejo rostos.
Sinto cheiros.
E abraços.
Então refuto.

Entre o sim e o não.
Existe um abismo.
De átomo, elétrons e prótons.
Neutrinos! Uma força pagã.
Que compulsivamente.
Amálgama.

Assim somos nós.
Pequenas partes do infinito.
Aonde co-existem Deuses,
Ciência e alívio.
Que, como não se bastassem.
Ainda me acalmam.

À beira de mim.
Me calo e clamo.
Inclinado e de joelhos.
A beira do horizonte.
Peço perdão.
A quem puder me ouvir.

À beira do horizonte.
O Sol já me basta.
Numa lição de sutileza.
De energia infinita.
De mormaço.
E razão.

Não sei.

Não me leve a mal.
Mas hoje estou péssimo.
Não quero soletrar seu nome.
Ao menos contar sobre o meu dia.
Que foi longo e morno.

Eu não sei sobre tanta coisa.
Sei quase sobre nada.
Apenas murmuro seu nome.
Com palavras quase noturnas.
Amenas como o outono.

Apenas não sei se devo.
Se posso ou se nego
Mas sendo sincero me entrego.
Sem saber de tudo.
Por nada.

Depois da Tempestade

Os sonhos fizeram as pazes comigo.
Pesadelos agora são nuvens brancas.
Que pairam como algodão num céu azul.

E o infinito, que um dia jurei fatal.
Agora me inunda de vida e promessas.
Como quem me diz sempre “sim”.

Extremamente longe eu me vi passar.
Gigante, deitei calmo na linha do horizonte.
E dormi ao relento, impávido sob o crepúsculo.

Esperando amanhecer.

De Passagem

Hoje falei contigo apenas para dizer nada.
Como quem precisa saber que está lá.
A segurança da distância calculada.
Me protege de qualquer dor.

Ainda com vestígios de silêncio.
Velados no auge da madrugada.
Nas entrelinhas de pegadas.
Quase apagadas pelo tempo.

Não sofro mais tanto quanto antes.
Apenas um martírio de minutos.
Uma bobagem, uma chuva de verão.
E isso é até confortante, não?

Hoje falei contigo apenas para dizer nada.
Apenas pra voltar na página virada.
Na ferida mal cicatrizada que arde.
Que incomoda como farpa.

E folhear novamente, para frente.
Sem dizer nada, como tem que ser.
Apenas de passagem.
Eu continuo.

A Vida

Por vezes penso que a vida é um suspiro.
Uma mensagem ou apenas uma citação.
Separada por vírgulas e pontos finais.
Uma cena de romance ou documentário.
Um festa de louvores em um mar de rosas.

Por vezes acredito no quem nem sei.
E admito que errei em vão na promessa.
No amor indecifrável achei que saberia,
Andar pelo quatro cantos da paixão,
Sem me perder em mim.

Por vezes escrevi tantas frases.
Caminhei por onde caminharam.
Recebi a graça do vento no olhar.
E a sombra da divina luz que me aquece.
E renova a chama que arde sem parar.

Por vezes destilei o cúmulo do sonhar.
Em visões tão verdadeiras que inebriam.
Mas se não é, por fim, essa a verdade.
Prefiro então não mais pensar.
Na beleza que é viver.

O Super-Humano

Rápido e impreciso.
De acento errado, comunica.
Na palavra batida, discursa.
Com a mão cerrada, conclama.
E de mãos abertas, exclama.

Voa até o infinito e volta.
Levando o mundo nas costas.
Ressuscita do albergue.
Das mais profundas ilusões.
E repousa celeste, na cama.

Arredio e trêmulo.
Ao pé do limoeiro, há sombra.
Voltando ao passado, discursa.
Com a mão na cabeça, duvida.
Se ao errar tanto, foi humano.

Sem mais temores e incrédulo.
Ainda ouve Suzana chamando.
De mãos espalmadas, a prece.
No mínimo pendura o terço.
De punhos unidos, pede.

Trancado há três dias no quarto.
Vestem seu rosto, sem pressa.
Sem capa e imortal, descansa.
De olhos abertos, espanta.
A salvação então, acontece.

Saudade Distante

Pra que essa saudade,
Esse domínio forte.
Que me arranca o sono.
E perturba a calma?

Deve ser um castigo.
Uma herança pré-histórica.
Alguma droga poderosa.
Que envenena…
Engana olhos e coração.
E se diverte contigo.
Machucando aos poucos.
Em todos os momentos.
Mesmo em silêncio.
Sussura alto.
Bate forte.
Deve ser um castigo.
Que dorme comigo.

Humildade

A humildade é uma coisa boa.
Parece uma coisa à toa.
Pequena e imensa.
Infinitamente densa.
Explode no caos.
Revela-se num gesto.
No encanto.
Recatada e breve.
Simples palavra.
Retumbante.
Ação.

Pode calar um trovão.
Transformar diamantes.
Em mirra, incenso e pão.
Desafia qualquer labuta.
Em silêncio se basta.
Descalça, desnuda.
Sem palavras.
Revela milagres.
Nem sim, nem não.
Deslumbrante.
Doação.

Mensagem para você

Perdão.
A dor de dizer adeus,
É tão dura.
Que não há cura.
Senão o tempo.

Perdão.
Por não ser seu.
Para o resto da vida.
Desfazer o sonho.
Que um dia brindamos.
E tantos foram os dias.
Que nos amamos.

Perdão.
Pela falta de carícias.
Por não saber entender.
O que faltava para você.
Pela minha imaturidade.
Pelas minhas demências.
E por tudo que não vi.

Perdão.
Eu quis cuidar de você.
Mas não soube cuidar de mim.
Se é que existe verdadeiro perdão.
Para quem amou demais.
Amou você.
Depois de tudo e do nada
Não haverá.
Jamais.

O dia em que for embora

Nesta hora quero estar bem longe.
A milhares de quilômetros de mim.
Não fugirei de nada,
Mas nem estarei aqui.
Serei patético, estátua, paralizado.
Não terei coragem de pronunciar seu nome.
Não farei qualquer oração.
Apenas pensarei por alguns instantes.
E lembrarei de tudo com amor.
Partirá meu coração e meu mundo.
Serei demolido e totalmente aniquilado.
Estarei plantado sobre meus pés.
Amarrado em puro sofrimento.
Não farei a mínima questão.
De mostrar coragem.
Conter emoção.
Apenas pasmo.
Rasgante emoção.
Que fere e dói demais.
Somente em pensar.
Aqui dentro.
Do meu coração.
Que um dia irá.
Embora daqui.

Meu Pai – 2

Se existe algo que admiro.
É tua força, teu semblante.
Lindo e forte, trêmulo e exato.
Amável e doce como pluma.
Sensível como seda.
Me suporta apenas com a força.
Da tua calma, que acalma.
Qualquer tempestade.

Se existe algo incomensurável.
É tua imensidão inextinguível.
Inenarrável, insuperável ao máximo.
Super herói, que sobrepuja
Qualquer outro herói.
Das estórias que ouvi.
Pois a tua mão amansa.
Qualquer desavença.
Toda tempestade.

Das coisas da vida

Outro dia te vi passar.
Rasgando flores ao seu pesar.
E inodoro, insípido era o olhar.
De que não ama a si próprio.
Nem ao menos um instante.

Busca ao acaso, insensato destino.
Doce e carente; amarrado semblante.
Regado do puro e insano eterno alívio.
De quem busca carente.
Num incesante alívio.
A cura pras coisa da vida.
Das coisas da vida.
Coisas da vida.
Da vida.

Nao fale assim do amor

Você diz o que quer e o que é.
Mas esquece que o importante é o amor.
Se você pensa que não sei ser o que sou.
Não entende que o importante é o amor.

E o que importa é amor.
Se não está presente não vale uma flor.
O que importa é o amor, é o amor, é amor!
Dedicado intrépido, impávido amor.

Mesmo cercado, arrebatado o amor.
Se mistura na dor de quem ama, é o amor.
Se dúvida que o amor é amor.
Então se tranca no fundo, no coração.

É amor, é amor.
Que desfaz toda fúria é o amor.
Se não entende a verdade, busca teu amor.
E se cala na fúria insana do amor.

É amor, o amor, é o amor.

Nas chamas do Hindemburg

Ouço Led e “Os Besouros”
E me pergunto o que há além?
Estavam many miles away from here.
Literalmente longe e perto d’alma.
Que havia de sobra
E já nem encarna mais.
Na flauta e distorção.
Havia silêncio e pausa.
Analógicos e sem bits.
Solos duplos de guitarra.
Sujos e brilhantes.
Oh, my Lord, my sweet Lord,
Onde está a velha escada pro céu?

Se as folhas continuam caindo.
Ainda acredito em backing vocals de anjos.
Soprando no vendo respostas.
De fato algo se perdeu no caminho.
Desde a faixa do pedestre descalço.
Até na escada-rolante que me leva.
Na língua de pedra que te fere.
Tudo consumido nas chamas pesadas.
Digitalizadas sem drama.
Em “zeros e uns”, poucos loucos.
Sobreviventes do último Hindemburg.

Pequenos movimentos

Um vídeo escolhido.
Pra gente ver a noite.
Nada pra fazer.
A não ser, você.

Uma piada ou trocadilho…
“Já fechou a janela da sala?”
“Você não vem dormir?”
Pequenos movimentos…

Beijo, cabelo, carinho.
Corpo, cheiro e voz.
Que falta me faz…
Saudade e ausência.
Nós.

Letras espalhadas em teclas.
Um fone de ouvido.
Uma linda canção.
Algumas cervejas.
E uma (in)certa… razão.

 

A Milésima Loucura

O que há por dentro desta alma que não sacia?
Desta busca pelo que não há domínio?
É sabido que há cálidas rosas entre barras de ferro enrustidas.
Em berços de deusas trêmulas adoradas em agonia.
De secos calcanhares descalços há vera ferida.
Ah.. seu louco saco sem fundo e sem juízo!
Além do que imagina, se já não bastasse, há tua própria “insolidez”.
Que mantida em segredo desnuda a própria alma e carne.
E descamba para a mais turva das entrelinhas.
E em sonhos morrerá de amores estranhos por ti.
Deixando um eterno e morno descanço.
Ah… loucura, o que há de interessante eu não sei.
Mas que existe um tanto de veracidade entre seus discursos, eu vi.
E dizem por aí que mais normais são as tuas faculdades.
Mesmo que cravadas ao punho na cruz de punhal.
E ferido arde com medo e desejo.
Que tudo isso seja tão importante, certeiro e vão.
Quanto a busca da liberdade tardia.
Da eterna crueladade do não saber.
Do que sequer ao menos valia.

O Grande Espaço Entre o Céu e a Terra

Não precisa gritar, mas se quiser e for melhor assim.
Que seja tão forte que faça soltar toda sua fúria.
De demasiadas lamúrias, despejadas e encenadas em seus dramas pessoais.
Desde quando disseram que não te amavam só para brincar.
Quando não te abraçaram de propósito só para te abandonar.
Ou te deixaram no escuro apenas pra ver sua cara boba de medo.
Ainda que tudo isso nunca tenha sido assim, tão pungente.
Isso! Esmurra essa porta que não se abre nunca.
Apaga aquela luz que pisca em seus olhos e não te deixou dormir nunca mais.
Grita, mesmo que o espaço tenha se tornado imensamente vago.
E tudo isso talvez nunca tenha sido assim, desse jeito.
Pois há um enorme vácuo entre o céu e a terra.
Onde no espaço nem ao menos propaga.
E de repente tudo silencia.

Sem Título

Me entitulo não sei quem.
Quem me dera ser alguém.
Ter um Samba ou um Rock.
O que me importa dar IBOPE?
Não me venha com uma rima.
Que eu rimo dissimulado.
Pra ver só se dá no rítimo.
Ou se rola um improvísimo.

Ou.. Ou.. Ou.. Ou…
A mensagem é improvável.
Ser o último indivisível.
Átomo, ótimo ou íntimo.
Na levada eu nego o óbvio.
Já que o mundo é inegável.
Resta da alma o suplício.
Acentado eu me conforto.
Quem diria que não digo.
Vai aí um imporviso?

Então aviso amigo sou.
Pois quem avisa amigo é.
E amigo não deslisa.
Nem sequer desmoralisa.
E continuo obediente.
Entre pauta, puta e metricá.
Mora afora, aflora e agora.
Um minuto pro impossível.

Quem me dera ser alguém.
Algemado eu suplico.
Beija minha face.
Cura o meu martírio.
E indescente eu me retiro.
Com vergonha eu me descalço.
E deito manso em leito calmo. 
Forrado, rotulado: Maurício.

Meu Pai

Meu pai.
Me escuta calado.
Tu és quem transforma.
O semblante turvo;
Em face ávida.
Dos deuses do mundo.
Da terra és um só.
Sonoro e plácido.
Tu perdoas sempre.
E sempre incansável.
Forte e adiante.
Não há obstáculo.
Nem ao menos penúria.
Ah… pai,
Me acolhe tão límpido.
Que morreria em teus braços.
Mas não mereces esta agonia.
Eu prefiro viver por ti.
Pois ao longo deixaste.
Impregnado no mundo.
Minha breve viagem.

Melhor Assim

Ama a ti mesmo antes que o drama te castigue.
Antes que a trama te domine e amoradasse.
Vôe a caminho desde o início, que continua sempre.
Enquanto há luz e calor entre a paz que busca.
E leve, tão leve, a levada moradia que te acolhe.
Na chegada e também na saída, quase sem saída.
Tão revelante quando a foto da noite daquele dia.
Entre árvores de sonho plantada em descanso.
Espreitando o recanto da mais bela nostalgia.
E num abraço vazio me arrepio ao acaso.
Mas me curo do fadado que por muito era agonia.
Agora só e em mim, canto pra nunca mais esquecer.
Que bastam pequenas coisas para me fazer feliz.
Basta o sol se pôr para tudo começar outra vez.

Samba para nunca esquecer

O que não se paga é o que se sente.
E vale mais que presente ou moeda.
Então deixa esse trocado,
Bem aí guardado, ao meio dobrado.
Larga no bolso daquela calça.
Aquela que menos gosta.
Que fica lá fundo do armário.
E quase não alcança.
Esqueçe ali no último cabide.
Mas leva nossas cantigas na bolsa.
E na manga da roupa nova que precisou vestir,
Bem passada, vincada e sob medida para nós,
As boas memórias, estampadas no tecido,
Na pele, na alma, na palma da mão.
Na palma da mão,
Na palma da mão,
Na palma da mão.

Outro belo amanhã

Tudo ao silêncio não silencia,
Se dentro de você nada cala.
E o mundo gira.
Como bola de fogo ou de neve.
Que queima e congela.
Mas ao tempo desfaz.
E não vale um minuto lembrar da dor.
Porque passará, há de passar.
Olhe o céu e sinta o vento e saberá.
Que nuvens vêm coloridas.
Trazendo a chuva que cai ao seu pesar.
E, contudo, acima de tudo, ela há de semear.
Em tantos outras terras e almas.
Silenciosa, noturna e calma.
Um novo e belo amanhã.
Que nascerá pra todos.
E tudo recomeçar.

Esqueça

Estar presente.
É necessário estar.
Ser presença de espírito.
Carne e osso maciço.
É isso, é assim, é preciso.
Como fonte que jorra na fogueira.
Jasmim que nasce em trepadeira.
Em precipícios dá vertigens.
Queima como fuligem de lareira.
Que acende a noite inteira.
Amedronta e adormece.
Por ser gigante, estremece.
De carinhos se envaidece.
E o que há de ontem,
Que não merece,
Por ser amor.
Tudo esquece.

Aprendiz

Quanto mais aprendo.
Entendo que menos sei.
E em cada dia que vai.
Tantos mitos caem.
Gestos impensados.
Carinhos mal acabados.
Brigas não seladas.
E por muito já me calei.
Por você e por mim.
Por que nunca saberei.
A medida certa.
A dose exata.
Da emoção.
Como deve ser.
Quando parar de rir.
Ou de chorar.
Exagerar ainda mais.
Enxergar além do infinito.
Para sempre serei.
Humilde, inacabado.
Eterno aprendiz.

                      Mauricio Bahia

Luabela

Papel e caneta.
Uma luz ilumina.
Da lua flutuante acima.
Através das grades.
Do andar mais alto.
Sozinho eu reflito.
E inevitavelmente
Penso na minha mulher.
Em todos os carinhos
Que dela me saciam.
Doce, como aquela lua.
É você quem prateia minha vida.
Até os caminhos do meu dia.
Pra toda noite retornar.
E me levar pra casa.
Onde moro feliz contigo.
Num lugar mais alto que o céu.
Tão perto quanto o chão.
Profundo como o mar.
Quente que nem sol.
A sua natureza é meu recanto.
Nossa cama, nosso canto.
Nela me recolho com jeitinho.
Juntando um pedacinho.
Do meu corpo no seu.
Pra te deixar dormindo.
Respirando devagar.
Flutuando em meu céu.
Serena Luabela.
Doce Isabela.
Me ilumina.

                      Mauricio Bahia

Vôo solo de Hypolito

No tablado quadrado.
Perfeito é o trajeto ensaiado.
Impossível não ficar espantado.
Movimentos acrobaticamente executados.
Minutos e  segundos cronometrados.
E no vértice do suspiro final, a explosão.
Quebrando o ar, há um corpo em contorção.
De tronco, braços, pernas, pulsos e mãos.
Equilíbrio suspenso de arte, plástica e precisão.
O tortuoso e extato vôo que toca, por fim, manso o chão.
Parado de pernas unidas é aclamada a apresentação.
A declarada poesia rimada é dedicada,
Por jus a quem conquistou a medalha dourada.
E, definitivamente, o solo gentil da pátria amada.

                                          Maurício Bahia

Hipnose Lunar

Observo a lua e suas crateras.
Impiedosamente bombardeadas no passado.
Por meteoros ou asteróides.
Imagino a lua como o amor.
Tantas vezes machucado.
Abalado e ferido.
Mas, apesar disso,
Das suas visíveis imperfeições.
Resiste a tudo e a todos.
Ainda me conquista.
E linda, hipnotiza.

 Mauricio Bahia

Um sonho de criança

O sorriso de uma criança.
É um sorriso.
Pura inocência.
De um sorriso.

Brincadeira de roda.
Outro sorriso.
Lambuzada de sorvete.
Parece que nem sente!

Pular corda e pique-esconde.
Faz manha pra mamãe ver…
Tá com sono, quer dormir.
Continua a sonhar.

Mundo colorido, pureza.
E sempre aquele sorriso.
Crescer pra que?
Ora, pra fazer criança!

 (eu e Isabela novamente. Um linha cada um.)

A Chuva

Vem chegando a chuva.
Benção do céu.
Destilada água de Deus.
Para lavar nossa alma.
Encher nossos copos.
Até transbordar.
E refrescar o corpo suado.
Limpar as impurezas.
Da sua pele.
Molhar a terra.
Serenar sob a lua.
Fazer o bem.
Enxaguar suas mágoas.
E perdoar.
Fechai vossos guarda-chuvas!

 (poesia feita “a duas mãos”.  Isabela escrevia uma linha, eu a próxima, depois ela novamente… Bincadeirinha legal!)

Para aquela que partiu

Quanto tempo e eu ainda aqui, sem te ver.
Agora, estou cansado e bebendo, pensando em você.
Tomando um drink para ‘comemorar’ a saudade.
Do pouco que me restou da sua face.
Dos pedidos para comprar cigarros.
E chamados a minha irmã na casa ao lado.
Daquela caixa de costura verde onde guardava tesouras e alfinetes.
O cavalete que, de pé, ainda apoiava a pintura inacabada.
No esboço de algo que ainda seria colorido.
 
Onde está o sangue que corria em suas veias
E pulsava em seu braço e sua voz que pouco recordo.
Cadê sua alma, ainda que em sonhos me acalma.
E sintir um pouco da sua presença tão bonita.
E tantos te amavam e era a mais querida.
Vestida em sua bata azul de céu.

Queria que me visse escrevendo esse texto.
Mas não tive tempo de fazê-lo e agora já não presta.
O que me resta é entender que a vida é mesmo assim.
Doce e repentina, como foste.

Mauricio Bahia

La Recette

Pensei em cozinhar macarrão com amor
E algum tempero, mas não sei a medida perfeita.
Então, que tal uma sobremesa de morangos aos beijos?
Talvez não seja o ideal, ainda que “trés sensual”.
Frango ao mel e carinhos, vinhos e florais aromáticos.
Humm…

Quem sabe então Nutela com seu cheiro e pele de pêssego?
Talvez mais doce fosse, se misturasse seus cabelos
De fios de ovos, e seios “pêra” numa torta perfeita, macia.
Protesto, pois “Gourmet” não sou, nunca fui, nem pretendo ser!
E, para quê tanto “mizanscene” se o que importa é amar você?
Ahhhh…

Mas, ela me pediu uma poesia de dia dos namorados.
E eu prometi um jantar neste dia doze de junho de 2007.
Que bolo…
“Mon amour”, se eu não conseguir realizar seus desejos,
Que esta poesia sacie ao menos seu coração de leão!
E eu prometo a você, aqui, neste papel,
Escolhido com carinho dentre mil-folhas.
Que para sempre um pedaço de mim será seu.

Mauricio Bahia

Amor Profundo

Profundo é o nosso amor.
Além do mundo é o nosso amor.
Imenso como mar adentro,
Que flui na correnteza sem fim.
De carne e osso é o nosso amor
E alma, silêncio e mais.
O que não tem explicação.
Nem se pode discutir.
Tão pouco é preciso divagar.
De tão certa é a certeza.
Do simples olhar.

Profundo é o nosso amor,
Como este mundo de sons e cores.
Feito perfeito pelo destino.
Incessantemente necessário,
Como dia e noite.
Soleira e luar.

Eu e você

Quando o caminho se torna um destino,
E a chuva, o vento, o mar
Se acalmam em seus lençóis.
E a terra me cerca com suas curvas.
A lua oculta, distrai nossos pensamentos.
Parece que tudo pára, tudo desaparece.
As ruas são eternamente desertas.
Totalmente nua, entre quatro paredes.
No mesmo quarto, na mesma sala,
Ao mesmo instante, a meia luz.

Mauricio Bahia

Tom

A doçura chegando,
Desperta aos poucos.
Nas teclas de um piano.
Como que brilhando na melodia.
Ao aconchego de uma viola.
Reunindo suspiros sinceros.

O ar vibra e faz música,
Que transcende sua própria existência.
E entre as frequências sonoras.
Há dedos, bocas, gestos e mumúrios.
Carinhosas cantigas em compasso.
Sopros de sol refletindo de lá
Harmonia da vida rimando de cá.

Mauricio Bahia

Parar jamais (oração para Você)

Eu agradeço pela chuva, pela luz e pela noite.
É incrível e fantástico pois tudo o que me cerca tem seu “algo”.
Obrigado por tocar minha alma com suavidade
Fazer acreditar no impossível que já é consumado, basta ver.
Eu não peço muita coisa, pois já tenho muito do que preciso.
Agradeço pelas flores, pelo mato e pelas cores.
Cada palmo dessa gravidade que me prende.
Obrigado pelos átomos que constroem e sustentam.
Pelo coração que pacientemente, pausadamente pulsa.
E bate sem parar, bate sem querer,
Sem querer parar jamais.

Mauricio Bahia

Na fotografia

Alguma coisa existe
Além do seu sorriso.
Incrivelmente diferente
De todos os outros sorrisos.
Que está incorporada
Ao momento da tua alegria
Que irradia e enlouquece
Mesmo quem a desconhece.

Alguma coisa existe,
Nessa sonora e perfeita harmonia
Que desencadeia de tua boca,
Sabiamente desenhada
Para compor um simples sorriso
Guardado para sempre na fotografia.

Mauricio Bahia

Pôr-do-sol

Havia muito tempo.
Que não escrevia.
Não destemia este impulso.
Lavava minha alma arraigada.
Entre as sombras dos pilares.
E marquises à beira mar.

Havia muito tempo.
Que não ouvia.
Qualquer cântigo de arvoredo.
Dentre as frestas e forquilhas.
Entre a cegueira causada.
Pelos holofotes da cidade.

Havia muito tempo.
Que as ondas não quebravam.
Nem a brisa e o cheiro do mar.
E a espuma que paira lentamente.
Caia em meu corpo como manto.
Envolvido pela luz amorosa do crepúsculo.

Saída

Sua chegada foi violenta.
Parecia vendaval.
Intenso e descabelante.
Rodeando como fogo.
Cegando com fumaça.
Cambalenado pernas.
Paralizando olhares.

Sua passagem foi suave.
Como nuvem no vento deslizando.
Azul claro misturado ao azul púrpura.
Muro vivo de planta que cerca.
Entrelaçando a planta dos pés.
Vivendo sem pressa.
Sem deixar ao menos aliviar.
Calando bocas.

Sua saída foi idêntica.
Àquele primeiro dia.
Intenso e insensato.
Levou tudo o que tinha.
Inclusive o que de mim faltava.
Desatou sem piedade.
Qualque parte, qualquer pedaço.
Se é que ainda existia.

Mauricio Bahia

Frágil

Sincera e frágil.
A vida que me deram.
A sombra que me segue.
Seu olhar inevitável.
A chuva que me cerca.
A cerca do seu quintal.
Que voou na ventania.
E perdeu-se para sempre.

Sincera e frágil.
Sua voz serena.
O sereno da madrugada.
E o balanço das árvores.
O quebrar das ondas.
Qualquer beijo seu.
A imensa paixão.
A paz que me causou.

Mauricio Bahia

Grito

Da tua boca calada um grito,
Um susto e um suspiro.
Do coração ferido uma dor.
Um frio e vontade de esconder.
Fugir para onde não há abrigo.
Dentro de um coração falido.
Pela demência que o próprio corpo lhe causou.
Pela falta que existia quando não chegava.
E nunca mais voltou.
Pela mudança súbita de todas as cores.
E sons e sinais e vozes.
Que antes eram bem-vindas.
Agora zumbindo em ouvidos.
Desde que você partiu .
Aquele bar e aquela esquina parecem de outros.
O que era nosso não mais me pertence.
Parece um deserto agora, do que antes era mar.
Um mar de razões para contemplar qualquer coisa.
Desde que estivesse por perto.
Para lhe escrever um pequeno recado.
Ou lhe contar o meu dia de trabalho.
Que nunca esteve tão longo e vazio.
Tão agudo e dissonante.

Medo

Ela tem medo e se esconde.
Ele tem medo e denuncia.
Ela incorpora a vítima.
Ele a renuncia.

Ela diz existir algo estranho.
Ele estranha o que havia ouvido.
Ela se faz de desentendida.
Ele então ensaia uma despedida.

Ela pede pra esperar.
Ele quer uma razão.
Ela cala por um segundo.
Ele silencia então.

Eles tencionam.
Seus lábios.
Seus olhos.
Suas pernas.
Seus corações.
Suas esperanças.
Pra aliviar essa aflição.
E soltar as palavras.
E dizer que tudo está bem.

E que assim seja:
Não precisam mais temer.

Mauricio Bahia

Infinito

No caso deste acaso,
Te falo do desconhecido.
Do outro, da outra.
Que de relance limito.
A balbuciar qualquer coisa.
Ora invento, ora imito.
Me chamam de amante,
Ou mesmo de amigo.
Me convidam pra dançar.
E te confesso ao pé do ouvido.
Que outrora te diria.
Palavras mais amenas.

Mas o tempo me ensinou
Que quem cala condena.
Por isso faço intrigas
Comigo mesmo.
E me pergunto se poderia.
Ser menos.
E nas palavras que confesso.
Meu amor mais valeria.
E agora me despeço da sinfonia.
Regida em mil versos como um dia.
Declamei minha sentença, tardia.

Agora que nem me visto,
Me vejo inteiro.
Sem perdão nem pelo.
Sem prelúdio,
Aos devaneios.
De um amor tardio.
Desatinadamente frio.

Mauricio Bahia

Guerreiros

Feri.
Com minha lança.
Que alcança meu colo.
Me perdoa Deus.
Por arremeçar por mim.
A ignorancia.
Incapaz e inconseqüente.
Eu não queria isso assim.
Desse jeito, nem para mim.
Mas o fiz passional.

Me perdoa por não amar tão belo assim.
E sangrar-me até que caia.
Até que durma sereno.
Eu preciso redimir.
De qualquer ato.
Fora de mim.

Intuição

Seu instinto é lindo,
Sua intuição é emoção.
Sua boca rima com louca.
Quase com prisão.

Tua voz é feroz quando ameaçada,
mas sempre doce e aveludada.
Você dependente de carinho.
Como um animal carente.

Me espera que já vou.
Estou preparando uma surpresa.
Estou fazendo um poema.
Sobre um tema antigo.

E você nem pode imaginar,
com o que estou rimando.
Não é com a palavra “amor”.
Nem precisaria.

Mauricio Bahia

Limite

O limite é uma asa,
Uma ponta de palito.
Uma pata de barata.
Uma bala perdida.

O limite é a dor.
Um caso de amor.
Um trote de madrugada.
Uma vida amargurada.

O limite é o medo de tentar.
É tentar sem combater,
É deter a libido,
Um consolo lascivo.

É apenas um começo,
Da fração que não termina.
Pois eterna é a dízima.
Na direção do infinito.

Mauricio Bahia

Tecnologia

Naveguei por bits infinitos.
Cortei a luz no prisma.
Curvei o espaço sideral.
Reduzi ao invisível.
Vi meu rosto no plasma.
Seus osso num raio-X.
Amanheci ainda drogado em dolantina.
Salvei tantas vidas.
Aniquilei tantas outras.
E fui amaldiçoado.
Então te levei pro espaço.
Beijei a face paralisada.
Reconstrui sua mão dilacerada.
E lambi sua voz num laserdisco.
Faço agora parte da sua vida nas cyberns.
Ainda que quanticamente incerto.
Criptografei o ódio na lápide.
Ressuscitei seu coração.
Livrei nossas mentes de seremos eternos.
Eternamente mortais sonhadores felizes.
Embaixo das marquises falsas protetoras.
Debaixo da fatídica chuva de meteoros.

Mauricio Bahia

Nós

Quando o caminho se torna um destino,
E a chuva, o vento, o mar
se acalmam em seus lençóis.
E a terra me cerca com suas curvas.
A lua oculta distrai nossos pensamentos.
Parece que tudo pára, tudo desaparece.
A rua da calçada, a varanda de minha casa.
Parece que o mundo anda descalço.
Totalmente despido.

Mauricio Bahia

Sinceridade

Eu só queria lhe dizer.
As velhas palavras de sempre.
Fazer carinhos tão simples.
Nos cabelos enrolados.
Sinceramente não preciso de muito.
Mas me diga quanto basta.
Para te fazer feliz para o resto dos dias?

Eu só queria saber.
A hora de parar e de recomeçar
Sinceramente às vezes eu me perco.
Por parecer quase impossível.
Querer tudo, todos os dias.

Vejo em mim então.
Quem espera mais do que deveria.
Sou eu também quem fantasia.
Quem cria essa necessidade.
E por isso me entrego, temo e tremo.
Longe da tua presença.
Que faz felizes todos os meus dias.

Mauricio Bahia